No último dia 15 de novembro, bem no aniversário da proclamação da República, morreu exatamente uma das figuras que protagonizou nosso retorno à democracia, o jurista, político e ex-policial Luiz Antônio Fleury Filho, aos meros 73 anos de idade. Desde muito cedo filiado ao MDB (antigo PMDB) e com breve passagem pelo PTB, foi secretário de Segurança Pública do estado de São Paulo (1987-1990) no governo de Orestes Quércia, também do PMDB, e deputado federal por dois mandatos (1999-2007). Porém, nacionalmente ele foi mais conhecido como governador paulista de 1991 a 1995, servindo provavelmente como “poste” de Quércia devido à ainda inexistente possibilidade de uma reeleição consecutiva pra cargos executivos.
Sua real projeção nacional se deu porque em 1992, houve uma cruenta repressão a uma rebelião generalizada no antigo complexo prisional do Carandiru – que foi demolido e em cujo lugar existe hoje o belo Parque da Juventude –, comandada pelo falecido coronel da PM Ubiratan Guimarães e concluída com a morte de 111 detentos. Apesar da mentalidade “punitivista” da maioria de nossa população, o fato manchou pra sempre a imagem política e administrativa de Fleury, mas não foi só por isso que ele foi muito criticado à época e é execrado ainda hoje. Quércia, por exemplo, teria quebrado o Banespa (banco estadual hoje privatizado) justamente pra eleger seu sucessor, e ele mesmo teve vários processos por corrupção nas costas e maltratou muito os professores. Fleury não fez diferente, desvalorizando a carreira docente e mandando a PM bater nos mestres que faziam greves e protestos. Em tempos de hiperinflação e do papel dos bancos estaduais na especulação e na emissão exagerada de dinheiro, arruinou a economia do estado, o que foi amplamente explorado pelo PSDB, partido rival, que elegeu Mário Covas como seu sucessor.
Cabe lembrar que o PSDB foi exatamente uma cisão do PMDB em 1988, daqueles que pregavam uma política mais liberal e discordavam dos rumos fisiologistas tomados pelo presidente José Sarney. Covas também se beneficiou do cenário imediatamente estável deixado pelo Plano Real comandado pelo também tucano Fernando Henrique Cardoso, que também em 1994 se elegeria presidente (e com a emenda da reeleição de 1996, Covas e FHC foram reeleitos, mas o governador morreria de câncer em 2001). Desde o retorno das eleições diretas pra governador em 1982, vencidas por André Franco Montoro, o PMDB fez seus governadores até 1994, quando o PSDB ganhou e se manteve (exceto por uns vices intermitentes) até 2022 com Geraldo Alckmin, José Serra, João Doria Jr. e Rodrigo Garcia. Este ano, finalmente Tarcísio de Freitas venceu pelo Republicanos, com o apoio óbvio de Bolsonaro, mas também de alguns tucanos como o próprio Garcia.
Minha mãe, que odeia Fleury (assim como minha avó, que também odeia Quércia, Covas, Alckmin, Doria, enfim, hehehe), acompanha esta página e certamente vai me perguntar: “Por que diabos você resolveu fazer uma publicação sobre ele?” É engraçado, porque mesmo eu tendo nascido no começo de 1988, tenho várias lembranças de eventos e polêmicas políticas de meados dos anos 90, uma habilidade que até hoje não entendo e que me levou às produções que você vê aqui desde 2014. Do massacre do Carandiru mesmo não tenho lembrança própria, mas tenho do estilo de farda e de carros que a PM usava naquela época. Quercia, Covas e Fleury, portanto, foram figuras que povoaram minha infância e começo da adolescência, tanto por aparecerem muito na mídia tradicional quanto porque minha mãe e minha avó são professoras aposentadas do município e do estado de São Paulo, e porque até o começo da minha adolescência frequentávamos muito os centros urbanos de São Paulo e Guarulhos, onde a propaganda política era mais visível, fatores que nos punham diretamente envolvidos com a administração pública. Nem preciso dizer dos xingamentos que escuto até hoje, rs.
Por exemplo, Fleury usou um catavento como logotipo de sua campanha “Um Novo Tempo” e o reproduziu na logomarca de seu governo, de forma que por muitos anos durante minha infância (por causa do governo, e não da campanha), eu chamava catavento de “Fleury”, hehehe:
Curiosamente, Fleury foi um dos governadores mais jovens a assumir em São Paulo (com quase 42 anos), mas sempre teve aquela cara de velho obeso, com todos os cabelos primeiro grisalhos, depois totalmente brancos. Fora isso, mil novecentos e noventa e quatro foi um ano bem doido e que foi marcante pra mim como criança, primeiro porque me mudei de um apartamento em Guarulhos, uma cidade enorme, pra zona rural de Bragança Paulista, cidade média do interior em que ainda conservamos nossa chácara cheia de plantas e ao lado de um bosque. Segundo, porque o Brasil viveu inúmeros eventos marcantes de roldão: o Plano Real (eu lembro quando fui trocar as notas com minha mãe no antigo Banespa ao lado da Câmara Municipal!), o Tetra da seleção de futebol, a morte de Ayrton Senna, a eleição de FHC como início de uma longa continuidade democrática, o sucesso do É O Tchan (rs)...
Fleury talvez não soubesse sambar, mas esteve presente em alguns desses vários eventos, como o funeral de Senna (olha o Paulo Maluf, então prefeito de São Paulo, ali no canto esquerdo!):
O relançamento do Fusca da Volkswagen, já saído de linha, mas solicitado pelo presidente Itamar Franco:
E a conquista do Tetra pela seleção, nesta imagem entregando um prêmio ao jogador Viola:
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