Como estamos nos aproximando dos 70 anos da Revolução Chinesa que trouxe Mao Zedong (antes escrito Mao Tsé-Tung) ao poder na China, vamos com o hino nacional do país mais populoso do mundo, e atualmente a segunda maior economia do planeta, cada vez mais se encostando nos EUA. O nome original da canção é Marcha dos Voluntários (na transliteração pinyin, Yìyǒngjūn Jìnxíngqǔ; 义勇军进行曲), e teve a letra escrita em 1934 por Tian Han e a melodia composta em 1935 por Nie Er. O hino já foi adotado pouco antes da vitória final da revolução comunista, mas passou por várias afirmações legais.
Ressalto que como historiador, estou fazendo uma “lembrança”, e não uma “celebração” dos 70 anos da Revolução Chinesa comunista, pois o blog é apartidário, e pro bem e pro mal, o evento foi determinante pros rumos do século 20. Apesar das políticas econômicas de Mao Zedong, a China hoje é uma economia pujante, dona do segundo maior PIB do mundo, nos quadros de um capitalismo estatizado que vem tirando cada vez mais massas humanas da pobreza e da extrema pobreza. Claro que eles têm problemas com democracia, controle de informações, liberdade de expressão e direitos humanos, mas acredito que gradualmente as sociedades em progresso desatam naturalmente esses nós. Além disso, muitos países ocidentais podem se considerar totalmente “livres”, mas sofrer com gargalos morais, comunitários, existenciais e de distribuição de renda. Portanto, querendo ou não, conheçam a China: ela pode ser os próximos EUA!
No século 20, a China trocou mais de hino do que o Brasil trocou de constituição: desde 1911, ainda na monarquia, quando a dinastia Qing adotou o primeiro hino nacional, a porção continental teve sete hinos nacionais, oficiais ou não, um deles readotado em versão modificada. Só lembrando: a república foi proclamada em 1.º de janeiro de 1912, e desde então o país não teve um governo único sólido, pois a maioria do território estava dividida entre os chamados “senhores da guerra”. Um deles era Jiang Jieshi, mais conhecido nos livros como Chiang Kai-shek, que liderava o movimento nacionalista Guomindang, ou Partido Nacional Popular, desde a segunda metade dos anos 20 e passou então a mandar efetivamente na China, começando a guerra civil contra Mao. Em 1928, o Guomindang adotou Três Princípios do Povo como hino nacional, ainda hoje usado em Taiwan, oficialmente a República da China não reconhecida pelos comunistas de Pequim.
O poeta e dramaturgo Tian Han (1898-1968) escreveu a letra em 1934 inicialmente como um poema dramático, mas em 1935 o músico Nie Er (nascido Nie Shouxin, 1912-1935) lhe compôs uma melodia pra que a canção fosse tocada no filme patriótico Children of Troubled Times. O governo comunista provisório da China adotou a música ainda em 27 de setembro de 1949 em caráter transitório, até o hino ser finalmente oficializado em 4 de dezembro de 1982. Ele só entrou como tema da Constituição após a revisão que ela sofreu em 14 de março de 2004 e enfim teve o uso regulado em 1.º de outubro de 2017. Embora seja mais conhecida no Ocidente como Marcha dos Voluntários, a tradução literal do título do hino em chinês é Exército Virtuoso e Corajoso, aludindo à guerra civil dos comunistas contra o Guomindang e à invasão e ocupação japonesas nas décadas de 30 e 40. Os exércitos de Mao e Jiang lutaram juntos contra o Japão, mas a canção nunca foi popular entre os nacionalistas.
Ironicamente, Tian Han foi preso em 1966, ao começar a “Revolução” Cultural na China, por causa de uma peça (de 1961!) considerada “venenosa” pelo governo, e acabou morrendo encarcerado em 1968. De 1966 a 1970, a canção comunista O Oriente é Vermelho (Dōngfāng Hóng; 东方红) serviu como hino nacional não oficial, até a Marcha dos Voluntários voltar a ser usada, mas sem a letra. Em 1978, foi adotada uma nova letra, com referências a Mao, ao Partido Comunista e à Longa Marcha, mas em 1982 a letra original, que vocês leem no vídeo, foi restaurada na sequência das políticas liberalizantes de Deng Xiaoping. Também usado oficialmente em Macau (desde 1999) e Hong Kong (desde 1997), a Marcha dos Voluntários difere dos hinos anteriores por ter sido escrita em chinês popular, e não na língua clássica antiga. Pelo que me consta, não há traduções em outras variantes do mandarim nem em outras línguas da China.
Duas curiosidades. Primeira: a canção O Oriente é Vermelho passou por um bom tempo pouco tocada pelos órgãos oficiais, por causa da lembrança dos excessos violentos em 1966-76, mas recentemente tem sido reabilitada, talvez pra associar a imagem do atual presidente, Xi Jinping, à de um “novo Mao Zedong”. Por isso mesmo, aparece não raro com o título O Oriente é Vermelho de Novo. Segunda: por falar em Mao, vocês devem estar se perguntando sobre as diferenças na ortografia de seu nome. Até a revolução comunista, era comum no Ocidente o uso de transliterações do chinês pro alfabeto latino mais ou menos fiéis aos sons, e muito variadas entre os autores europeus. Com a padronização nacional do mandarim, adotou-se a transliteração pinyin regulamentar, que embora lembre outros sons a um leitor brasileiro, deve ser lida com o som chinês original. “Mao Tsé-tung” lembra muito mais a pronúncia correta, enquanto “Mao Zedong” soa quase do mesmo jeito, mas apenas segue o padrão imposto.
Eu baixei o vídeo original desta página, que parece ser uma abertura da programação de TV, e eu mesmo legendei. Como não sei quase nada de chinês, o processo de tradução foi bem interessante: primeiro, usei as traduções em inglês e francês da Wikipédia pra fazer o texto-base, pra nada infelizmente me servindo as traduções em russo (que era poética) e português. Depois, joguei o texto chinês no Google Tradutor, e com o resultado em várias línguas (que comparei entre elas, muito semelhantes entre si) revisei um pouco o texto-base. Porém, achei interessante que embora o Google Tradutor desse algo bem mais literal, o sentido não era de todo errado. Por isso, resolvi guardar também os resultados em inglês, russo e esperanto, que vocês veem abaixo, obviamente com alguns reparos! Seguem abaixo as legendas, a letra original chinesa em caracteres tradicionais, simplificados e em latim pinyin, a tradução-base em português e os resultados do Google Tradutor:
Chinês simplificado:
Chinês tradicional:
Transliteração pinyin:
Português do texto-base:
Português do Google:
Inglês do Google:
Russo do Google:
Esperanto do Google:
|
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Deixe suas impressões, mas não perca a gentileza nem o senso de utilidade! Tomo a liberdade de apagar comentários mentirosos, xenofóbicos, fora do tema ou cujo objetivo é me ofender pessoalmente.