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Como diz o sertanejo Serge Rois, “casserole vieille est qui fait bon repas”.
Apenas vários meses após a gravação eu terminei de legendar o vídeo em que Emmanuel Macron faz seu discurso da vitória no pátio em frente ao Museu do Louvre. Desde a própria semana da votação do 2.º turno, que ocorreu em 7 de maio de 2017, eu já tinha começado a fazer a legendagem, mas a chegada dos trabalhos finais de semestre e a necessidade de reescrever meu projeto de pesquisa do doutorado me obrigaram a parar por um tempo. Macron, comemorando sua vitória, falou ao povo à noite, no famoso ponto turístico, aludindo não apenas à posse, que ocorreria no dia 14, mas também às eleições legislativas nacionais de 11 e 18 de junho. Quando ele fala em “bancada”, quer dizer na verdade uma “maioria parlamentar”, que lhe seria necessária pra governar.
A França estava triste com crise econômica, desemprego e terrorismo sob Sarkozy e Hollande, dos dois partidos principais, e queria uma real alternância. Marine Le Pen, do Front National, parecia ser uma saída à extrema-direita, e Emmanuel Macron, do En Marche!, a renovação europeísta, internacionalista e de centro. A insatisfação também era com o sistema político, pois no 2.º turno, 74,56% dos votantes qualificados compareceram: haviam sido 80,35% em 2012 e 77,77% no primeiro turno de 2017 (o voto não é obrigatório). Nas legislativas, que lá ocorrem em dois turnos, foi ainda pior: 48,71% dos votantes aptos no dia 11, e 42,64% no dia 18. Emmanuel Macron ganhou com 66,1% dos votos válidos, e seu (renomeado) La République en marche! reuniu 313 deputados entre os 577 da Assembleia Nacional.
Desde o princípio, seu primeiro-ministro é Édouard Philippe (Les Républicains), cujo anúncio foi aguardado até o último instante e que até agora já formou duas composições ministeriais, de grande heterogeneidade partidária. Já de início, Macron pôs em prática as amplas reformas do Estado e da vida pública, que ele anunciou neste discurso, e foi visto por muitos como uma espécie de oposto de Donald Trump e de sua política nacionalista e agressiva. Não houve grandes conflitos quando os dois líderes se viram pela primeira vez, e geopoliticamente eles continuam próximos. Segundo as forças anti-hegemônicas, Macron é o candidato dos bancos que, na prática, permitiu uma reacomodação do mesmo antigo sistema, contra o qual os franceses se sublevaram. Em 21 de dezembro, Macron fez 40 anos, tendo sido o mais jovem presidente da República eleito, e sua esposa Brigitte, que foi sua professora de colegial, tem 64 anos.
Eu baixei o vídeo sem legendas do canal BFMTV, que o postou logo depois do evento, no mesmo dia. Eu mesmo traduzi e legendei, pelo famoso método “3 em 1”: escutei, traduzi e legendei ao mesmo tempo. No site do partido de Macron, há também a transcrição integral da fala em francês. Eu achei muito engraçado como meu vídeo com o discurso de Macron em estúdio, que eu legendei logo após sua vitória, de alguma forma “bombou” pra escala que pode ser aplicada pro meu canal. O motivo simplesmente foi que ele aparecia relacionado a algum dos inúmeros vídeos com teorias conspiratórias que chamam o presidente de... illuminati e anticristo.
Não por acaso, toca-se durante a chegada de Macron o Hino à Alegria, que é também hino da União Europeia. Seguem abaixo as legendas e a tradução em português, paragrafada conforme o texto em francês na página do partido:
Obrigado, pessoal!
Agradeço-os por aqui estarem esta noite! Vocês são dezenas de milhares, mas só posso ver alguns rostos. Obrigado, valeu por estarem aqui, por terem lutado com coragem e boa vontade por tantos meses. Porque sim, vocês venceram esta noite, a França venceu! O que fizemos, depois de tantos e tantos meses, não tem precedentes, nem equivalentes. Todo mundo nos dizia que era impossível, mas eles não conheciam a França!
Obrigado pela confiança, pelo tempo que vocês deram, obrigado a todas e todos pelo compromisso. Obrigado a alguns que correram riscos. Eu sei deles. Esta confiança me dá deveres, sou seu depostário a partir de agora. Não os decepcionar, estar à altura dessa confiança e levar, durante os próximos cinco anos, o impulso de vocês, impulso que vocês encarnam!
Quero também esta noite dar uma palavra aos franceses que votaram em mim, sem adotar nossas ideias. Vocês se engajaram, e sei que não se trata de uma carta branca. Quero dar uma palavra aos franceses que votaram apenas para salvar a República face ao extremismo. Sei como discordamos, vou respeitá-los. Mas serei fiel a este compromisso que assumi: proteger a República.
E quero enfim dar uma palavra aos que votaram hoje em Marine Le Pen. Não os vaiem! Eles exprimiram hoje uma raiva, uma angústia, por vezes suas convicções. Eu os respeito. Mas farei tudo nos próximos cinco anos para que eles não mais tenham nenhum motivo para votar nos extremos.
Esta noite, há as francesas e os franceses apenas, o povo da França reunido, e o que vocês esta noite representam, aqui no Louvre, é um entusiasmo, um fervor, é a energia do povo da França! E este lugar em que nos encontramos diz isso. Ele testemunhou nossa história: do Antigo Regime à Libertação de Paris, da Revolução Francesa à audácia desta pirâmide. É o lugar de todos os franceses, de todas as francesas! Este lugar é o da França, que o mundo está olhando, pois esta noite é a Europa, é o mundo que estão nos olhando!
A Europa e o mundo esperam que defendamos em todo canto o espírito iluminista, sob ameaça em tantos lugares. Eles esperam que defendamos sempre as liberdades, que protejamos os oprimidos. Eles esperam que tragamos uma nova esperança, o novo humanismo de um mundo mais seguro, de um mundo com liberdades defendidas, de um mundo com crescimento, mais justiça e mais ecologia. Eles esperam, enfim, que sejamos nós mesmos!
A tarefa que nos aguarda, meus caros concidadãos, é imensa. Ela começará a partir de amanhã. Ela exigirá moralização da vida pública, a defesa de nossa vitalidade democrática, o reforço de nossa economia, a construção das novas proteções desse mundo em nosso entorno, a cessão de um lugar a cada um pela escola, trabalho e cultura, a refundação de nossa Europa e a garantia da segurança a todos os franceses.
Essa tarefa que nos aguarda é imensa, e ela exigirá que continuemos audaciosos. Sim, esta noite ganhamos um direito que nos responsabiliza. Vocês escolheram a audácia, praticaremos essa audácia, e a cada novo dia continuaremos praticando, pois isso é o que as francesas e franceses esperam, isso é o que a Europa e o mundo esperam de nós! Eles esperam que a França os impressione de novo, que a França seja ela mesma, e é isso que vamos fazer!
Nossa tarefa é imensa, meus amigos. Ela exigirá o empenho de cada um, o empenho das forças armadas, de nossas forças policiais, de todos os nossos serviços públicos, de cada uma e cada um de vocês, dos políticos, das associações, dos assalariados, dos patrões, dos sindicatos, servidores públicos, artesãos, comerciantes, agricultores, estudantes, aposentados.
Nossa tarefa é imensa, e ela exigirá que se imponha a verdade, se encoraje a verdade, o que durante esta campanha nós fizemos constantemente, e que continuarei fazendo por vocês. Nossa tarefa é imensa. Ela exigirá que construamos a partir de amanhã uma bancada majoritária, uma bancada forte. Essa bancada de mudança é o que o país deseja, e é o que ele merece. Essa bancada de mudança é o que espero de vocês daqui a seis semanas, pois precisarei cada vez mais de vocês!
Meus caros concidadãos! Vocês todas e todos que estão aqui junto a mim há tantos e tantos dias, tantas e tantas noites. Povo da França, aqui reunido no Louvre, nós temos a força, nós temos a energia, nós temos a vontade, aquela que nos levou, aquela que nos fez assim. É isso que orientará nosso futuro. Em nada cederemos ao medo, em nada cederemos à divisão, não cederemos em nada à mentira, não cederemos em nada nem à ironia, às panelinhas, ao amor pelo declínio ou derrota alheios. Sei desse fervor que vocês estão carregando, eu sei do que devo a vocês, e esta noite sei o que devo a meus companheiros de jornada, a meus amigos, minha família e aos meus íntimos.
Nem todo dia será fácil. Eu sei disso. A tarefa será árdua. Vou sempre dizer a vocês a verdade. Mas o fervor, a energia e a coragem de vocês sempre me levarão! Vou proteger vocês ante as ameaças. Vou combater por vocês a mentira, o imobilismo, a ineficácia, pela melhoria da vida de cada um. Vou respeitar cada uma e cada um em seus valores e em seus pensamentos. Vou unir e reconciliar, pois desejo a unidade de nosso povo e de nosso país. E enfim, meus amigos, vou servir a vocês com humildade, com força. Vou servir a vocês em nome de nosso lema: Liberdade, Igualdade, Fraternidade. Vou servir a vocês sendo fiel à confiança que vocês me depositaram. Vou servir vocês com amor.
Viva a República! Viva a França!
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