quarta-feira, 13 de setembro de 2017

“A Internacional” como Hino Soviético

Quando postei a segunda legendagem desta canção, foi um presente duplo aos espectadores: de Ano Novo e de início das comemorações do centenário das duas revoluções russas (fevereiro e outubro) de 1917. Trata-se da tradução russa da Internacional (em russo, “Интернационал”, Internatsional), que serviu de hino soviético até 1944. A primeira versão que postei é de dezembro de 2011, mas no primeiro dia de 2017 fiz uma retradução, bem melhorada, adequei o vídeo ao padrão atual dos meus hinos nacionais e escrevi uma pequena história da canção.

Devo sempre lembrar que essa não é a tradução brasileira da Internacional. Esta é apenas a tradução literal da versão poética em russo, ou seja, nesta língua, ela segue a métrica artística, e na nossa, não. As traduções poéticas em português, que em geral começam com “De pé, ó vítimas da fome... De pé, famélicos da terra...”, podem ser encontradas aos montes no YouTube. Decidi traduzir literalmente a versão russa porque a julgo como um documento histórico independente da canção A Internacional em si, hino socialista e anarquista traduzido pra centenas de línguas.

A tradução da Internacional que mais se consagrou na Rússia na virada dos séculos 19 e 20 foi a do poeta e tradutor Arkadi Iakovlevich Kots (1872-1943), cujo nome de nascença era Aron e assinava também como “A. Danin”, “A. Bronin”, “A. Shatov” e “D-n”. Sua versão da Internacional é de 1902, quando saiu na revista Zhizn (Vida) de Londres, mas só tinha o refrão e as estrofes 1, 2 e 6 do texto original. Kots só traduziu o resto em 1931, resultado publicado apenas em 1937. Os sociais-democratas russos usavam a tradução de Kots como hino partidário, e Lenin gostava muito da canção, dizendo que era um tipo de símbolo comum que unia os operários do mundo todo. Em 23 de janeiro de 1918, tornou-se hino da República Socialista Federativa Soviética da Rússia e, em 30 de dezembro de 1922, da URSS.

Seguindo o nacionalismo de Stalin, houve nos anos 30 um concurso pro novo Hino Nacional da URSS, encerrado quando uma peça de Sergei Vladimirovich Mikhalkov, Gabriel Arkadievich El-Registan (letra) e Aleksandr Vasilievich Aleksandrov (melodia) foi aprovada em 14 de dezembro de 1943 pelo Birô Político do PC e executada no rádio pela primeira vez na noite de 17 pra 18 de abril de 1944. A melodia desse hino e o famoso começo do refrão – Slavsia, Otechestvo nashe svobodnoie (Glória à nossa Pátra livre) – ainda estão hoje no Hino Nacional da Federação Russa, e a tradução de Arkadi Kots da Internacional é agora o hino do Partido Comunista da Federação Russa (KPRF), do Partido Operário Comunista da Rússia integrado ao Partido Comunista da União Soviética (RKRP-KPSS) e da União da Juventude Comunista Revolucionária (bolchevique) (RKSM(b)).

Na segunda metade de 2016, eu já fiz uma retradução da Internacional em russo encomendada pelo historiador Daniel Aarão Reis pra coletânea que ele estava organizando e anotando, Manifestos vermelhos e outros textos históricos da Revolução Russa. Aliás, eu também traduzi vários textos, atas e manifestos escritos ao longo do ano de 1917, por monarquistas, bolcheviques e mencheviques, inseridos nessa coletânea. O livro saiu há alguns meses, e por isso faço meu “merchan” aqui: como foram minhas primeiras traduções publicadas, comprem e divulguem o livro que saiu pela Penguin-Companhia das Letras! Assim, dado que os direitos autorais ficaram com a editora, fiz algumas alterações nessa nova tradução pra que eu pudesse inseri-la nas legendas do segundo vídeo.

Assim como faço com os hinos das repúblicas da URSS, o áudio do segundo vídeo tirei desta página. Eu fiz a montagem da bandeira da RSFS da Rússia usada de 1918 a 1920, com o brasão que vigorou na mesma época. Seguem abaixo as duas legendagens, a letra em cirílico que serviu de hino de 1922 a 1944 e a tradução em português. A transliteração no segundo vídeo foi baseada no meu próprio sistema, então vejam este duas vezes, lendo uma legenda de cada vez!




1. Вставай, проклятьем заклеймённый,
Весь мир голодных и рабов!
Кипит наш разум возмущённый
И смертный бой вести готов.
Весь мир насилья мы разрушим
До основанья, а затем
Мы наш, мы новый мир построим, –
Кто был ничем, тот станет всем.

Припев (2x):
Это есть наш последний
И решительный бой;
С Интернационалом
Воспрянет род людской!

2. Никто не даст нам избавленья:
Ни бог, ни царь и не герой.
Добьёмся мы освобожденья
Своею собственной рукой.
Чтоб свергнуть гнёт рукой умелой,
Отвоевать своё добро, –
Вздувайте горн и куйте смело,
Пока железо горячо!

(Припев 2x)

3. Лишь мы, работники всемирной
Великой армии труда,
Владеть землёй имеем право,
Но паразиты – никогда!
И если гром великий грянет
Над сворой псов и палачей, –
Для нас всё так же солнце станет
Сиять огнём своих лучей.

(Припев 2x)

____________________


1. Levante, mundo servilizado,
Com fome e chagado pela desgraça!
Nossa razão rebelde está queimando
E pronta para lutar a batalha mortal.
Vamos arrasar o mundo ditatorial
Desde as bases, e logo depois
Edificar uma Terra nova, nossa,
Quem não era nada vai ser tudo.

Refrão (2x)
Este é nossa último
E decisivo combate;
Pela Internacional
Os homens renascerão!

2. Ninguém vai nos libertar:
Nenhum Deus, tsar ou herói.
Vamos chegar à emancipação
Com nossas próprias mãos.
Para destruir o jugo de forma hábil
E retomar o que era de vocês,
Ardam a fornalha e batam no ferro
Com coragem enquanto ele ferve!

(Refrão 2x)

3. Somente nós, operários do Grande
Exército Mundial do Labor,
Somos autorizados a reger o mundo,
Mas nunca os aproveitadores!
E se explodir uma grande trovoada
Sobre a súcia de cachorros e algozes,
Do mesmo jeito vai se pôr a raiar
Para nós as luzes do fogo do Sol.

(Refrão 2x)



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