domingo, 6 de setembro de 2015

Votos de François Hollande para 2015


Link curto para esta postagem: fishuk.cc/voeux2015

Discurso do Presidente da República francês François Hollande expressando aos cidadãos seus votos de um Feliz Ano Novo para 2015, pronunciado e transmitido do Palácio do Élysée a 31 de dezembro de 2014. Título original: “Vœux du président de la République aux Français”.

Hollande inicia a alocução ressaltando as grandezas da França e os motivos pelos quais seus cidadãos poderiam se orgulhar dela, e que dariam, assim, a base para se acreditar que o país tinha um grande futuro pela frente, desde que se evitassem passadismos em detrimento da audácia. Em seguida, o presidente lista as amplas reformas que seu governo buscou empreender no difícil ano de 2014, como na economia, no trabalho, no emprego e na divisão territorial, e anuncia outras reformas que em 2015 pretendia fazer no ensino, na tributação, na assistência social e na questão da eutanásia. Hollande reafirma também compromissos morais e políticos com a integração europeia, o republicanismo, a união nacional, o meio-ambiente, a paz mundial e contra os demagogos, a xenofobia, o racismo, o antissemitismo e a guerra. Por fim, dedica uma lembrança às pessoas na França que passam necessidade e renova seu pedido para que o povo confie no país, no governo e na própria laboriosidade.

O texto em francês, o vídeo e o áudio do pronunciamento podem ser acessados conjuntamente nesta página do Élysée. O vídeo sobre o qual coloquei as legendas também pode ser assistido sem elas nesta página. Abaixo você pode ver também o próprio vídeo legendado, no qual, é claro, sempre são feitas as necessárias adaptações a esse tipo de mídia:



Meus caros compatriotas,

É uma mensagem de confiança e persistência que lhes dirijo esta noite lhes expressando meus votos para o Ano Novo. Sei das dificuldades em que nos encontramos, levo-as em conta a cada dia e penso esta noite nas famílias apreensivas pelo futuro de seus filhos diante do desemprego e por vezes até mesmo da exclusão. E quero acabar (1) com o descrédito e a desesperança.

A França é um grande país: ela é a quinta potência econômica do mundo, ela toma suas responsabilidades sempre que a paz está ameaçada, graças à intervenção de nossos soldados na África, no Iraque, a quem quero saudar onde quer que estejam; eles fazem honra à sua bandeira.

A França tem uma diplomacia ativa que busca incansavelmente a solução para conflitos em lugares como a Ucrânia, onde me envolvi pessoalmente, ou o Oriente Médio. A França faz a Europa avançar: foi ela que sustentou a prioridade do crescimento com o plano de investimento de 315 bilhões de euros, que será lançado em 2015 pela Comissão Europeia.

A França é reconhecida por suas inovações, por sua cultura, pelo talento de seus empreendedores, inventores, pesquisadores. Ela foi honrada este ano com dois prêmios Nobel.

Temos, portanto, todas as razões para confiar em nós mesmos, mas com uma condição: avançar, dar mostras de audácia, rejeitar o status quo, descartar o regresso. Fiz a opção pelo futuro mantendo total fidelidade aos valores da República e a nosso modelo social.

A França não é uma nostalgia, mas uma esperança. Meu dever, com o governo de Manuel Valls, é fazer tudo, realizar tudo para preparar a França de amanhã, é dar tudo por nosso país.

Acredito na perseverança, na constância, no trabalho incessante. O ano de 2014 foi difícil, balizado por provações de todo tipo. Sem jamais ceder, segui firmemente o objetivo que havia fixado.

Eu havia anunciado a vocês o pacto de responsabilidade no começo do ano; ele entra em aplicação amanhã de manhã. As empresas e os trabalhadores independentes verão seus encargos baixarem, não haverá mais nenhuma cotização patronal para um assalariado pago pelo salário mínimo. (2) As empresas devem agora empregar e investir. É o sentido da palavra “responsabilidade”, pois nossa obrigação, diria nossa obrigação comum, é combater o desemprego.

Também foram realizadas grandes reformas ao longo de todo o ano agora findo. Assim, a partir de amanhã, 1.º de janeiro, a arduidade do trabalho finalmente será levada em conta no cálculo dos direitos à aposentadoria; o sistema deverá se tornar o mais simples possível para as empresas, para o que cuidarei pessoalmente, em acordo com os parceiros sociais (3) que se engajaram eles mesmos numa negociação essencial pela qual se espera modernizar o diálogo social em nosso país.

Igualmente, a reforma territorial, que havia sido mil vezes anunciada e mil vezes abandonada, foi adotada em menos de seis meses. E no ano que vem vocês serão chamados a eleger os políticos dessas futuras coletividades. Não importa quem vocês escolham, haverá mais eficácia e menos gastos.

A França, portanto, é capaz de se transformar, e sei que vocês estão prontos para isso. E é o que vamos fazer também em 2015. Primeiro, com a lei a ser apresentada em janeiro pelo Ministro da Economia, Emmanuel Macron. Ela vai despertar as iniciativas e a atividade, quebrar as rendas, liberar energias, desenvolver o emprego, simplificar a vida das empresas sem desproteger os assalariados. Será uma renovação para nossa sociedade, pois essa lei se destina principalmente aos jovens.

Os jovens serão sempre minha prioridade, com meios suplementares para combater as desigualdades escolares, com jovens professores mais bem formados, com o lançamento de um grande plano digital nas escolas, pois quero que a França seja o primeiro país da Europa em utilização da mais moderna tecnologia. Será uma ótima ferramenta de conhecimento, e também de justiça social. Pois a França só é forte quando ela é justa.

Em 2015 também será suprimida – no que me engajei – a primeira faixa do imposto de renda; o abono de família passará a variar em função das posses; o acompanhamento aos idosos será melhorado; o acesso a cuidados médicos será facilitado sem se colocar em causa a liberdade dos profissionais de saúde.

Mas também devemos ser capazes de conversar sobre os assuntos mais difíceis, diria os mais íntimos, para a sociedade: refiro-me ao fim da vida e ao direito de morrer com dignidade. Desejo que em 2015 o Parlamento possa adotar uma lei consensual que contribua para reduzir sofrimentos e leve em conta a vontade dos doentes.

Meus caros compatriotas, a França avançará no ano que vem, em todos os domínios e para todos. Esse é o combate que lancei e que levarei até o fim, contra os conservantismos – que são numerosos – e contra os populismos – que são perigosos. Diante do desemprego, venceremos dando mostras de iniciativa, e não nos paralisando ou nos isolando do resto do mundo. Rejeitemos os discursos que enganam e iludem o povo.

Com a Europa, não é destruindo o que existe ou pretendendo sair da zona do euro que convenceremos, mas restaurando nossa própria competitividade, mobilizando todas as alavancas econômicas para nos livrarmos da estagnação no continente e fundando bases democráticas à zona do euro.

E diante das ameaças que ascendem e inquietam, chamadas terrorismo, comunitarismo, (4) fundamentalismo, não é nos dividindo, estigmatizando uma religião ou cedendo ao medo que nos protegeremos, mas defendendo firmemente nossas regras comuns: a laicidade, a ordem republicana, a segurança das pessoas, a dignidade da mulher. É quando a França esquece seus princípios que ela se perde e submerge. Aí está o declínio, o único que nos ameaça, o da capitulação. Não é novidade na história, tanto da França como da Europa, nunca nos esqueçamos. É por isso que faço da luta contra o racismo e o antissemitismo uma grande causa nacional.

Devemos igualmente nos orientar por meio do compromisso, que é uma virtude para a Nação, é o que nos une numa mesma pátria. Assim, o serviço cívico (5) será estendido para todos os jovens, em toda sua diversidade, todos os jovens que fizerem a solicitação.

2015, meus caros compatriotas, será um ano essencial também, diria antes de tudo, para o planeta. A França receberá a conferência do clima em dezembro próximo, a qual reunirá os chefes de Estado e de governo do mundo inteiro. É uma ótima oportunidade para unirmos, antes de tudo, a nós mesmos além de nossas diferenças, partilharmos o que temos de melhor e restituirmos sentido ao progresso. A França deve ser exemplar – e é – com a lei da transição energética, já votada pela Assembleia Nacional, e com a lei da biodiversidade.

A França conseguiu, já faz 70 anos, reunir uma grande conferência pelos direitos universais do homem. Devemos agora levar o mundo a adotar, por sua vez, uma declaração pelos direitos da humanidade para preservar o planeta. E farei de tudo para que em Paris, em 2015, a conferência seja um sucesso, pois, quando nossos filhos ou netos nos perguntarem sobre o que conseguimos fazer em 2015, quero que possamos ter o orgulho de lhes dizer que contribuímos para preservar o planeta inteiro.

Meus caros compatriotas da metrópole, do ultramar ou vivendo no exterior, esses são os votos que faço para o ano que se inicia. 2015 deve ser um ano de audácia, ação e solidariedade. E esta noite penso em particular nos mais frágeis, nas pessoas sozinhas, nos desprovidos e em todas as vítimas dos dramas ocorridos nos últimos meses.

Mas minha mensagem é a da confiança; confiança em nós, em todas as forças de nosso país, em nossa vitalidade, e por isso posso dizer esta noite: viva a República e viva a França.


Notas do tradutor
(Clique no número para voltar ao texto)

(1) No vídeo: “Mas quero acabar”.

(2) Em francês, trata-se do SMIC, o Salaire minimum interprofessionnel de croissance, que tem algumas diferenças em relação ao salário mínimo brasileiro.

(3) Na França, o termo “partenaires sociaux” designa, em comitês de trabalho e reuniões, o conjunto dos principais sindicatos profissionais – sindicatos de assalariados e organizações patronais – responsáveis pela gestão de certos órgãos paritários. Em Portugal, por vezes se fala em “parceiros sociais”, mas no Brasil isto se refere antes a acordos entre entidades públicas e/ou privadas com fins beneficentes.

(4) No debate intelectual, “comunitarismo” é originalmente uma abordagem social que critica a sobrevalorização liberal do indivíduo, situa-o como inextricável à sua comunidade cultural, étnica, religiosa ou social, e defende fenômenos coletivos, como a sociedade civil. Mas na polêmica francesa, de modo geral, “communautarisme” seria, para seus opositores, uma subjugação das pessoas pelo seu grupo de pertencimento, especialmente étnico ou religioso, em detrimento dos valores nacionais ditos laicos, republicanos e universalistas. Os críticos desta interpretação rejeitam-na como uma forma de racismo burguês, branco e masculino, dirigido em especial aos muçulmanos.

(5) O service civique, criado em 2010, visa reunir pessoas de idades e origens diversas num “compromisso cidadão” em torno do projeto de nação, por meio do voluntariado dentro ou fora da França em instituições associadas, com despesas pagas pelo Estado e emissão de certificado.



Nenhum comentário:

Postar um comentário

Deixe suas impressões, mas não perca a gentileza nem o senso de utilidade! Tomo a liberdade de apagar comentários mentirosos, xenofóbicos, fora do tema ou cujo objetivo é me ofender pessoalmente.