domingo, 26 de janeiro de 2025

“Eleições” em Belarus (26 de janeiro)


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Primeiro, você me pergunta por que comecei a escrever “Aliaksandr Lukashenka” em belarusso no lugar de “Aleksandr Lukashenko” em russo, embora esta seja a língua preferida do ditador. Ora, durante a sovietização, cujo espírito o novo dirigente nunca encerrou – embora pela lei o belarusso seja uma língua oficial de igual direito com o russo –, a língua local foi sendo cada vez mais marginalizada da esfera pública, resultando que muitos hoje entendem, mas poucos falam o idioma belarusso autóctone. Não, essa predominância do russo não é um “fato natural”, e a verdadeira cultura nativa deve ser revalorizada! Portanto, a partir de hoje, assim como no texto abaixo, todos os topônimos e nomes de pessoas relacionados a Belarus, transliterados a partir da língua belarussa, e não da russa.

Sobre este texto, recebi uma cópia diretamente das mãos da autora, sob o título “Comunicado de imprensa – ‘Eleições’ em Belarus em 26 de janeiro”. Volha é a representante brasileira das Embaixadas Populares de Belarus, organização dirigida pela líder dissidente Sviatlána Tsikhanóuskaia (às vezes transliterada em russo como Svetlana Tikhanovskaia), cujo marido, Siarhéi, foi preso ao se candidatar contra Lukashenka nas eleições de 2020. Ela se candidatou em seu lugar e reivindicou a vitória, mas, correndo igualmente risco de prisão, se exilou e hoje comanda a oposição unificada num gabinete alternativo, coisa inexistente sequer em estado embrionário entre os russos no exterior.

O bananeiro médio, sobretudo esquerdista e anti-EUA, precisa entender que em Belarus não existe mais política como entendemos, que nenhuma instituição estatal é independente, que Lukashenka é um ditador cleptocrata ainda mais violento que Putin e que o país, longe de ser um bastião anti-imperialista, se tornou um grande quartel anexo ao Kremlin. Portanto, segue o referido comunicado, com algumas correções e adaptações minhas, que também foi comentado por vários portais democráticos de geopolítica:



No dia 26 de janeiro, ocorrerá em Belarus um espetáculo que Aliaksándr Lukashénka insiste em chamar de “eleições”. Após usurpar o poder em 2020, quando perdeu as eleições, seu objetivo agora é “virar a página” e tentar conquistar alguma aparência de legitimidade. Contudo, as circunstâncias em que este ato de autoindicação acontece são mais parecidas com uma operação militar do que com um processo eleitoral.

Desde já, é evidente que isso não pode ser chamado de eleição, mas sim de uma farsa, pois as condições em que está sendo realizada estão longe de permitir eleições livres e justas:


1. O país continua enfrentando uma intensificação das repressões

Nos últimos quatro anos, foram registrados por organizações de direitos humanos mais de 74 mil casos de repressão, incluindo buscas, detenções e interrogatórios.

  • Cerca de 65 mil pessoas foram detidas.
  • Foram abertas mais de 15 mil ações criminais desde as eleições de 2020. Há pelo menos 7 759 pessoas identificadas como alvos de processos criminais com motivação política, e cerca de 7,4 mil estão aguardando julgamento.
  • Cinco pessoas foram mortas durante os protestos e detenções.

Apesar disso, as repressões políticas em Belarus não apenas não cessaram, como se intensificaram com a aproximação das chamadas “eleições”. Houve várias ondas de detenções preventivas de ativistas políticos e sociais envolvidos em movimentos passados. As prisões voltaram a ficar superlotadas, como em 2020, com celas projetadas para quatro pessoas abrigando até 16.

O ano de 2024 foi ainda mais repressivo do que os dois anos anteriores. No ano passado, pelo menos 8 895 pessoas enfrentaram perseguição criminal ou administrativa (incluindo detenções, interrogatórios e buscas) – uma média de cerca de 24 casos de repressão por dia.

  • Pelo menos 1 721 pessoas foram condenadas em processos criminais por motivos políticos.
  • Houve 5 890 decisões judiciais baseadas em artigos administrativos.

E esses números são, na verdade, significativamente menores do que a realidade, pois representam apenas os casos conhecidos pelas organizações de direitos humanos, que não têm acesso a todas as informações sobre as repressões.

Nenhum processo criminal foi instaurado com relação às mortes de manifestantes ou às torturas sofridas pelos detidos e condenados.


2. Grande número de presos políticos – cerca de 1,3 mil pessoas

Mais de 2,4 mil presos políticos já foram libertados, após passarem anos sob condições de tortura em virtude das sentenças arbitrárias dos tribunais controlados por Lukashenka. Na realidade, o número total de presos políticos é significativamente maior, já que muitas famílias evitam enviar documentos para o reconhecimento formal de seus entes como presos políticos. Isso ocorre porque as condições nas prisões para aqueles reconhecidos como políticos são muito mais severas e frequentemente incluem torturas.

De acordo com o Centro de Direitos Humanos “Viasná”, em 29 de dezembro de 2024, pelo menos 224 presos políticos estavam encarcerados sob condições de alto risco. Entre eles:

  • 104 pessoas com sérios problemas de saúde física;
  • 11 pessoas com deficiência;
  • 46 idosos (60 anos ou mais), muitos deles com graves problemas de saúde;
  • 29 mães e pais de famílias numerosas;
  • 16 pessoas com transtornos mentais.

Durante esse período, sete presos políticos morreram enquanto estavam detidos.

Pelo menos nove pessoas estão em regime de incomunicabilidade, ou seja, vivem em completa desconexão com o mundo exterior. Não há informações sobre eles, não há correspondência, visitas de parentes ou acesso a advogados. Por exemplo, Marýa Kalésnikava ficou mais de 600 dias sem qualquer contato com o mundo exterior, até que, em novembro de 2024, foi autorizada a encontrar-se com seu pai.

Nas prisões de Belarus, também estão encarcerados ex-candidatos à presidência nas eleições de 2020:

  • Víktar Babarýka: condenado a 14 anos de colônia penal de regime reforçado.
  • Siarhéi Tsikhanóuski: condenado a 19 anos e meio de regime fechado.

Nenhum processo criminal foi instaurado com relação às torturas nas prisões ou às mortes de presos políticos.


3. Ausência de liberdade de expressão e restrições ao trabalho da imprensa independente

No Índice de Liberdade de Imprensa 2024, Belarus ocupa a 167.ª posição entre 180 países.

Desde 2020, a maior parte da mídia independente em Belarus perdeu seus registros. Jornalistas continuam sendo constantemente detidos e condenados a longas penas de prisão por realizarem seu trabalho. A imprensa independente praticamente deixou de existir dentro do país, com muitas redações agora operando do exterior. A maioria dos sites e páginas em redes sociais foi rotulada como “formações extremistas”.

De acordo com a Associação de Jornalistas de Belarus (BAZh), em 20 de dezembro de 2024, pelo menos 45 profissionais da mídia estavam presos. Todos foram incluídos na lista de “pessoas envolvidas em atividades extremistas”, e sete deles foram classificados como “terroristas” pelo KGB [Comitê de Segurança do Estado, que manteve nome, estrutura e funções dos tempos soviéticos].

A pena média de prisão para jornalistas belarussos é de seis anos. No entanto, alguns profissionais receberam sentenças ainda mais severas por sua atividade totalmente legítima:

  • Íhar Lósik: 15 anos;
  • Andréi Aliaksándrau: 14 anos;
  • Dzianís Iváshyn: 13 anos;
  • Liudmíla Chékina: 12 anos;
  • Marýna Zólatava: 12 anos;
  • Valérya Kastsiuhóva: 10 anos.

Segundo um estudo dos “Repórteres sem Fronteiras”, Belarus é o quarto país do mundo com o maior número de jornalistas presos.

Nenhum processo criminal foi instaurado com relação às sentenças ilegais contra jornalistas ou ao fechamento de veículos de comunicação independentes.


4. Ausência de condições iguais para a livre candidatura

A campanha para as chamadas “não eleições” ocorre sob o total controle do regime de Aliaksandr Lukashenka.

A Comissão Eleitoral Central registrou, além dele, mais quatro “candidatos alternativos” ao cargo de presidente. Todos eles são líderes de estruturas pró-regime:

  • Aléh Haidukévich (Partido Liberal-Democrata);
  • Hánna Kanapátskaia (ex-membro do Partido Cívico Unido);
  • Siarhéi Syrankou (Partido Comunista);
  • Aliaksándr Khizhniák (Partido Republicano do Trabalho e da Justiça).

Após as eleições de 2020, todas as forças políticas independentes foram eliminadas em Belarus. Apenas quatro partidos pró-regime permanecem ativos. Além disso, pelo menos 1 838 organizações não governamentais foram fechadas, incluindo sindicatos, associações civis, fundações, partidos políticos, ONGs e organizações religiosas.

Diante deste cenário, é evidente que esses “candidatos alternativos” são meramente uma imitação de concorrência.

Nenhum processo criminal foi instaurado com relação à dissolução ilegal de organizações não governamentais ou às repressões contra representantes do setor cívico.


5. Apuração não transparente dos votos

Desde 1996, nenhuma eleição em Belarus foi reconhecida por observadores independentes como transparente e em conformidade com os padrões democráticos.

  • O princípio da liberdade de escolha não é garantido. Os cidadãos são forçados a assinar apoio a Lukashenka por meio de chantagem e ameaças, como perder o emprego, a moradia ou, no caso de estudantes, ser expulsos das universidades.
  • Não há apuração dos votos. Não existem observadores independentes nos locais de votação. Aqueles que atuaram como observadores em 2020 enfrentaram repressões e perseguições.
  • O princípio da universalidade do direito ao voto não é garantido. Nenhum local de votação foi estabelecido para cidadãos belarussos no exterior. O presidente da Comissão Eleitoral Central, Íhar Karpénka, declarou que não considera isso uma violação dos direitos dos eleitores.

Cerca de 2 milhões de belarussos que vivem no exterior foram privados do direito de voto. Para participar da votação, foi sugerido que retornassem a Belarus. O Centro de Direitos Humanos “Viasná” documentou pelo menos 73 casos de prisão de pessoas que voltaram ao país.

  • Não há igualdade de condições para campanha eleitoral. As comissões eleitorais são compostas exclusivamente por apoiadores do regime, todos selecionados e aprovados pelo KGB.
  • Alterações no Código Eleitoral impediram a publicação dos dados pessoais dos membros das comissões eleitorais, supostamente para “proteger os membros de influências agressivas”.
  • De acordo com a iniciativa de ex-agentes de segurança BelPol, 97% dos atuais membros das comissões eleitorais participaram das eleições anteriores.

Diante disso, não há dúvidas de que Lukashenka tentará novamente usurpar o poder de forma ilegal e se declarar “reeleito”.

Nenhum processo criminal foi instaurado com relação às violações massivas, fraudes e à tomada ilegal de poder nas eleições anteriores.

Nos documentos anexos, você encontrará mais informações sobre as “eleições” e os planos das forças democráticas de Belarus, em inglês:

“Elections” in Belarus 2025

BelPol – “Elections” 2025

Se tiver interesse, como representante da Embaixada Popular no Brasil, estou disponível para conceder uma entrevista ou comentário, assim como para organizar uma entrevista com Sviatlána Tsikhanóuskaia, Pável Latúshka ou outros líderes da Belarus democrática.


Atenciosamente,
Volha Yermalayeva Franco,
representante da Embaixada Popular no Brasil
brazil@belarusabroad.org



sábado, 25 de janeiro de 2025

Cabeça de Rola parabeniza Laranjão


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Antes de começar a abordar a ordem do dia na reunião com os membros permanentes do Conselho de Segurança da Rússia, em 20 de janeiro de 2025, o ditador fez uma breve digressão pra parabenizar Trump pela posse, já que ele tem medo de levar uma bomba na cabeça a qualquer momento, se não atender aos caprichos do golfista amador. Putin se aproveita da burrice e da ignorância em geopolítica crônicas nos EUA, mas particularmente agudas entre os republicanos MAGA e a fachosfera global em geral, chamada por Macron de “Internacional Reacionária”, fazendo passar a impressão de alguma legitimidade de suas “reivindicações” na região.

Nada parecido com os primeiros parabéns em 2016, solenemente dados num grande salão do Kremlin: o chefe de guerra de Taubaté tem tanto medo desse retorno que reservou apenas um aparte no meio de um momento de trabalho, devidamente bunkerizado. Como sempre, ele edulcora o apocalipse imperial-expansionista e genocida que ele próprio criou (será que está realmente ciente das consequências, dentro da própria bolha?), insistindo em falar de simples “crise ucraniana” e “operação militar especial”... Segue o trecho separado do vídeo e minha tradução da parte correspondente da transcrição, tudo disponível no portal do Kremlin:


Quanto aos eventos nos EUA, Donald Trump está sendo empossado hoje como o 47.º presidente em Washington. É óbvio que, em todos os aspectos, o período pré-eleitoral não foi fácil pra Trump: ele e até mesmo seus familiares estiveram constantemente sob forte pressão, o que levou até mesmo a atentados contra sua vida. Mas ele demonstrou coragem e obteve uma vitória incontestável nas eleições.

E vemos as declarações do presidente recém-eleito dos EUA e dos membros de sua equipe sobre o desejo de restabelecer contatos diretos com a Rússia, interrompidos a nosso despeito pela administração que sai. Também ouvimos suas declarações sobre a necessidade de fazer tudo pra evitar uma 3.ª Guerra Mundial. É claro que saudamos tal atitude e parabenizamos o presidente eleito dos EUA por sua posse.

Ressalto que nunca nos recusamos a dialogar e sempre estivemos prontos pra manter relações equilibradas e cooperativas com qualquer administração americana; já falei várias vezes sobre isso. Partimos do princípio de que o diálogo vai se construir em bases equitativas e respeitosas, tendo em conta o papel significativo que nossos países desempenham numa série de questões cruciais na agenda global, incluindo o fortalecimento da estabilidade e segurança estratégicas.

Também estamos abertos a dialogar com a nova administração dos EUA sobre o conflito ucraniano. O mais importante aqui é eliminar as raízes da crise, sobre as quais já falamos muitas vezes, é o principal. Quanto à resolução da situação em si, gostaria de ressaltar mais uma vez: seu objetivo não deve ser uma trégua curta ou uma espécie de respiro pras forças se reagruparem e pra nos rearmarmos e continuarmos posteriormente o conflito, mas uma paz a longo prazo baseada no respeito aos interesses legítimos de todas as pessoas e povos que vivem nesta região. Mas nós, é claro, vamos lutar pelos interesses da Rússia e de seu povo. Este, de fato, é o objetivo e sentido por que conduzimos a operação militar especial.



sexta-feira, 24 de janeiro de 2025

Mande pros amigos putinminions


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Se eles ainda acreditam nas lorotas sobre “junta neonazista de Quiévi”, “genocídio de russos” e “a culpa é da OTAN”, mande o lindo vídeo abaixo de soldados russos fuzilando soldados ucranianos desarmados e rendidos na região de Donetsk, que a propaganda do Kremlin insiste em dizer que pertence à Moscóvia! Está circulando aos pedaços nas redes sociais desde 22 ou 23 de janeiro, portanto, aproveite a oportunidade, pois abaixo ele segue na íntegra.

A idiotice russa é tão ilimitada que eles mesmos filmam provas contra si pra serem usadas em tribunais internacionais... É verdade que os “defensores da pátria”, a quem a ditadura mafiosa dedicou o ano de 2025, foram completamente bestializados pelos superiores na linha de frente. Mas tenho certeza que o Cabeça de Rola escondido num de seus bunkers no palácio junto ao mar Negro nem toma conhecimento, e se tomasse, faria de tudo pra evitar, só pra não juntar provas (além dos massacres em Bucha, Irpin e Mariupol) contra si mesmo!

ATENÇÃO: Não veja o vídeo se isso puder lhe causar desequilíbrio emocional!



Mais fontes internacionais:

Politico.eu: Kyiv investigates another case of Russian soldiers executing Ukraine POWs

The Sun: Sick new Putin ‘war crime’ as barbaric Russians ‘film themselves shooting Ukrainian prisoners dead in mass execution’

Quanto à fonte original, ela é bloqueada no Brasil. Muitos sites ucranianos como este, com informação que podia ajudar a combater a desinformação putinista, nem entram sob o “Governo do Amor” sem VPN, porque somos considerados “ataque malicioso”:



quinta-feira, 23 de janeiro de 2025

Por que a Lava Jato não deu certo


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Esta matéria da Rádio França Internacional (RFI), publicada em 20 de janeiro de 2025 e assinada por Yann Le Ny, foi intitulada (em minha tradução) “O caso Odebrecht: do escândalo de corrupção internacional ao fracasso judicial”. Ela dá uma perspectiva, a partir do exterior, de como a célebre e histórica operação “Lava Jato” não foi destruída por razões políticas, e sim por erros processuais grosseiros e por armação política da parte de Sergio Moro, o “Marreco de Maringá”, e de Deltan Dallagnol, não citado na reportagem, mas que todo mundo sabe estar implicado nas “trocas entre magistrados”. Obviamente, como os próprios colaboradores ressaltam, essa destruição abriu caminho pra que outros corruptos subissem ao poder e prevenissem a emergência um combate melhorado à corrupção sistêmica...

Além de traduzir, retirei informações redundantes pro leitor brasileiro ou lusófono (como os nomes completos dos partidos e a explicação de que “lava jato”, na verdade também chamada aqui de “lava rápido”, significa “lavagem expressa”) e acrescentei notas entre colchetes com breves recordações interessantes, correções ou explicações. Também mantive na matéria os links originais que achei pertinentes.



Neste dia 20 de janeiro de 2025, começa no Panamá o julgamento por lavagem de dinheiro e corrupção da empresa Odebrecht, no qual são citados 31 réus, incluindo ex-membros do governo. Esse escândalo, que tem origens no Brasil com a operação “Lava Jato”, afetou muitos líderes em toda a América Latina.

Tudo começou em 2014 no Brasil, com uma grande investigação liderada por Sergio Moro, um jovem magistrado que rapidamente se tornou uma personalidade no combate à corrupção. A operação “Lava Jato” (em referência a uma busca realizada num posto de gasolina no início da investigação) revelou uma vasta rede de corrupção em torno da petrolífera estatal brasileira Petrobras e de dez grandes empresas de construção, incluindo a Odebrecht.

Durante cerca de dez anos, essas empresas de obras públicas partilharam entre si contratos no momento das licitações da Petrobras e os superfaturaram. Propinas foram então pagas aos dirigentes da petrolífera e a vários partidos políticos.

Uma bomba política no Brasil – A investigação teve um efeito explosivo, num Brasil em plena crise econômica. Diversos políticos do PT, do MDB e do PSDB foram alvo da investigação. Foram citados os nomes dos presidentes Michel Temer e Lula. Aliás, Lula vai passar quase um ano e meio preso por isso. Dilma Rousseff, então presidente do Brasil, e que tinha sido presidente do conselho de administração da Petrobras de 2003 a 2010, foi reeleita por estreita margem. Seu nome não apareceu durante a operação, mas o clima político se agravou. Após as eleições, os protestos massivos contra o governo aumentaram até seu impeachment, em 2016.

Gradualmente, o escândalo da Petrobras se transformou no caso Odebrecht, quando se descobriu que a construtora tinha implantado uma vasta rede de corrupção que afetava não apenas o Brasil, mas diversos países latino-americanos. Na época, a Odebrecht (que se tornou Novonor em 2020) era um poderoso conglomerado cuja principal atividade eram obras públicas.

No Peru, todos os chefes de Estado que governaram entre 2001 e 2018 (Alan García, Alejandro Toledo, Ollanta Humala e Pedro Pablo Kuczynski) foram acusados de ter recebido propina da construtora brasileira. Alan García se suicidou antes de ser preso, em 17 de abril de 2019. No Equador, o ex-presidente Rafael Correa foi condenado a oito anos de prisão por corrupção em 2020. Outras 17 pessoas receberam a mesma sentença, incluindo o ex-vice-presidente Jorge Glas. No México, Emilio Lozoya, ex-diretor da petrolífera estatal Pemex e próximo do ex-presidente Enrique Peña Nieto, foi acusado de ter recebido 10 milhões de dólares em propina.

O escândalo também afetou Angola e Moçambique, dois países africanos de língua portuguesa. Em Moçambique, a Odebrecht teria pago quase 900 mil dólares em propina entre 2011 e 2014.

Um fracasso judicial – Mas após mais de sete anos de revelações, a operação “Lava Jato” foi bruscamente interrompida em fevereiro de 2021. Em 2019, uma investigação do The Intercept [a famosa “Vaza Jato”] acusou o juiz Sergio Moro, então muito admirado por seu trabalho, e os promotores de se acordarem pra excluir Lula das eleições presidenciais de 2018, mesmo que ele estivesse liderando as pesquisas. As investigações também provocaram um sentimento antissistema que impulsionou o político de extrema-direita Jair Bolsonaro à presidência em 2018. O próprio Sergio Moro seria nomeado ministro da Justiça por um breve período em 2019 [na verdade, até abril de 2020], sob a presidência de Bolsonaro.

O uso político do caso desacreditou a investigação. Aos poucos, o trabalho judicial realizado durante a operação “Lava Jato” ruiu diante das diversas deficiências observadas. Os magistrados recorreram a numerosos acordos de colaboração com a Justiça [como a delação premiada], detenções e buscas policiais que acabaram sendo consideradas excessivas.

O papel dos EUA na operação também pesou nas dúvidas sobre a “Lava Jato”. O Departamento de Justiça americano interveio graças a sua lei chamada Foreign Corrupt Practices Act (FCPA), visando práticas de corrupção no exterior. Por meio dessa lei, a Odebrecht e a Petrobras tiveram que pagar ao Departamento de Justiça americano multas que deveriam retornar ao Brasil. Os promotores brasileiros preferiram alocá-las numa fundação privada, e não no tesouro público. Ao final, essa criticada iniciativa foi barrada pelo STF, que anulou a criação da fundação em 2019.

“A forma totalmente opaca como estes atores operaram no Judiciário, com violações de regras processuais, fez com que boa parte desses processos fossem por água abaixo”, aponta Gaspard Estrada, cientista político da unidade do Sul Global da London School of Economics. Em 2023, o juiz do STF José Antonio Dias Toffoli anularia todas as provas contra o presidente Lula, declarando que sua condenação tinha sido “um dos maiores erros judiciários da história do país” [matéria da CNN Brasil]. Em 2024, também foram anuladas as provas contra Marcelo Odebrecht, ex-chefe da empresa.

Recuo das conquistas no combate à corrupção no Brasil – Para Gaspard Estrada, o balanço da operação foi negativo devido a seu impacto sobre a corrupção: “Toda essa operação Lava Jato foi um grande desperdício, porque infelizmente podemos ver claramente que ela não acabou com a corrupção, nem no Brasil nem na América latina. Indicadores da ONG Transparência Internacional comprovam: a posição do Brasil na percepção da corrupção não avançou muito desde 2014, ou seja, desde o início da operação.”

Em resposta, os parlamentares brasileiros até reverteram as conquistas na luta contra a corrupção no Brasil. Em 2019, foram introduzidas sanções mais rigorosas contra magistrados que ultrapassassem suas funções. Para a Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe), isso “prejudica gravemente as instituições estatais destinadas a fazer cumprir a lei e a julgar práticas criminosas e prejudica a separação de poderes e a independência do poder judicial”. Além disso, sob a presidência de Bolsonaro, os parlamentares obtiveram o direito de distribuir fundos aos beneficiários da sua escolha por meio de um mecanismo apelidado de “orçamento secreto” devido à falta de transparência. Alegou-se que tais despesas foram utilizadas em casos de corrupção.

Uma década depois, a histórica operação contra a corrupção não conseguiu criar uma elite política que consolidasse as instituições democráticas e o Estado de direito no Brasil. E é disso que reclama uma parte da população, cuja desconfiança tem crescido desde então. “Todos esses procedimentos contribuíram pra degradar o vínculo de confiança que já estava enfraquecido entre as elites políticas e econômicas e a sociedade. Isso ajudou a ruptura democrática a se reforçar ainda mais”, acrescenta Gaspard Estrada.

Os desdobramentos externos também ameaçados? – Porém, no exterior, o trabalho judicial continua, mesmo após o fim da operação brasileira. O ex-presidente peruano Alejandro Toledo foi condenado a 20 anos e seis meses de prisão em outubro de 2024. Em 2023, o Ministério Público colombiano anunciou que indiciaria 55 pessoas, incluindo o ex-presidente da Odebrecht, Marcelo Odebrecht, por atos de corrupção na construção de uma estrada entre o centro do país e a costa caribenha. Após anos de atraso, o Panamá iniciou um megajulgamento anticorrupção em que cerca de 36 pessoas vão estar no banco dos réus. Dois presidentes, Ricardo Martinelli e Juan Carlos Varela, são citados nas investigações, acusados de terem recebido propina entre 2008 e 2014.

O fracasso brasileiro poderia atingir outros julgamentos em países latino-americanos devido ao papel central dos EUA na cooperação judicial internacional. Uma colaboração entre magistrados que ocorreu informalmente sem a ciência dos ministros responsáveis. “Isso viola o princípio da soberania judicial, cria muitos problemas processuais, de rastreabilidade das provas e, portanto, prejudica o próprio processo”, afirma Gaspard Estrada. “Penso que vai ser interessante ver como os tribunais panamenhos vão resolver esse caso no tocante à admissibilidade das provas provenientes da cooperação judicial com os Estados Unidos. Vimos que em vários países, como no México, os advogados têm usado o encerramento de processos no Brasil pra justificar o fim dos processos no México.”



quarta-feira, 22 de janeiro de 2025

Canções partisans iugoslavas (3)


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Depois da última publicação em 2019 com a tradução de algumas das chamadas “canções partisans” iugoslavas, a maioria em esloveno, enfim termino com aquelas cuja letra consegui localizar e que tinham alguma tradução pra outra língua. Infelizmente, o YouTube derrubou meu canal Pan-Eslavo Brasil em agosto de 2021 e, se antes disso eu incorporava aqui os vídeos legendados que eu fazia com essas músicas, agora só tem as letras originais e traduzidas pro português, além dos vídeos com as gravações originais. A maioria dos áudios foi gravada pelo Partizanski pevski zbor (Coral Partisan) da Eslovênia, país que ainda cultiva a memória da resistência antifascista da 2.ª Guerra Mundial, sem por isso achar que “na época do socialismo tudo era melhor”. Algumas canções já foram publicadas separadamente na página ao longo dos anos.

Algumas das canções tecem louvores a Josip Broz, o Marechal Tito, mas a maioria faz referência à resistência contra a invasão nazista. Comecei a me interessar por essas músicas ainda com 16 anos de idade, quando quase ninguém ainda tinha redes sociais e nem o YouTube existia. Por um acaso, pesquisando nos mecanismos de busca sobre a Iugoslávia socialista, achei na época a rica página Titoville, que funciona até hoje, com fotos, textos e áudios de discursos e canções do período. Confesso que o regime titoísta (1943-91) foi o único pelo qual tive alguma simpatia, mas na adolescência. Na época, eu só escutava as músicas partisans em MP3 no computador, e a partir de 2011 também num velho celular, e sequer sabia que boa parte delas era cantada em esloveno, e não em servo-croata.

Durante a graduação em História, aprendi russo, e algum tempo depois, um pouco de outras línguas eslavas, incluindo as bases do esloveno, mas nunca me aprofundei. Usando agora os múltiplos recursos que a internet oferece, fui traduzindo ao longo dos anos algumas canções iugoslavas em servo-croata e em esloveno. Escolhi usar a palavra partisan em francês, mais adequada ao contexto de 1939-45 e mais abrangente, equivalente ao eslavo meridional partizan (com “z”) e ao italiano partigiano Em francês, significa literalmente “partidário” ou “relativo a partido(s)”, mas evitei “guerrilheiro”, que às vezes é justamente traduzido como partisan fora do contexto europeu, porque a meu ver os partisans era apenas alguns dos adeptos, como vários em outros tempos e lugares, da “tática de guerrilha”.

A primeira canção se chama Jutri gremo v napad (Amanhã partiremos ao ataque), composta por Janez Kuhar, e a segunda se chama Kdo pa so ti mladi fantje (Quem são esses jovens), também conhecida como Naša vojska (Nosso exército), como se vê no vídeo abaixo, e seu autor é Marjan Kozina. As duas letras estão num tópico que alguém criou num fórum de variedades, com algumas dessas músicas traduzidas pro inglês, e comparei essas traduções com o resultado que o Google Tradutor dava em português quando eu jogava o texto em esloveno. Não há indicação da data, mas provavelmente também devem ser da época da resistência, isto é, primeira metade da década de 1940.

Com a dissolução do Império Austro-Húngaro, um quarto do território de população eslovena passou pra Itália, que durante o “vintênio fascista” praticou uma italianização forçada, não sem resistência nativa. A invasão de Mussolini levou à anexação completa da Eslovênia, até sua libertação pelos partisans, que também obtiveram esse “quarto faltante”, embora ainda haja minorias eslovenas nos países vizinhos. O litoral esloveno é bastante reduzido e a cidade italiana de Trieste (ou Trst) fica bem na fronteira, tendo sido outrora bem mais eslovena que a própria capital atual, Ljubljana. A península da Ístria, bem protuberante nos mapas e onde fica Pola (Pula), terra natal de Sergio Endrigo, pertence à Croácia.

Recomendo também um material que usei na publicação de 2019 e na que apareceu ontem. Esta seção de um portal bem maior contém as traduções de algumas canções iugoslavas, e existe também um rico site com o áudio e a letra de muitos cantos populares eslovenos, mas escrito só na língua local.


Amanhã partiremos ao ataque
Veja como o céu é profundo
Ó, neve, nossa irmã branca
Despeje na escuridão, escuridão
Vento errante, nos dê sua mão
Lua preguiçosa, corra atrás de nós
Vamos, vamos com um rifle no ombro
Ao ataque pela liberdade e pelo pão

As estrelas já estão brilhando pra nós
E iluminam nosso caminho escuro
Este quer que também vá
A Lua sobre ele, sobre ele
Vento errante, nos dê sua mão
Lua preguiçosa, corra atrás de nós
Vamos, vamos com um rifle no ombro
Ao ataque pela liberdade e pelo pão

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Jutri gremo v napad
Glej, kako globoko je nebo
Sneg naš beli brat
Razlij se v temo, temo
Veter potepuh, podaj nam roko
Mesec lenuh, hitreje za nami
Mi gremo, gremo s puško na rami
V napad za svobodo, za kruh

Zvezde že nam žare
Pot nam razsvetljujejo temno
Ta hoče ta gre
In mesec nad njo, nad njo
Veter potepuh, podaj nam roko
Mesec lenuh, hitreje za nami
Mi gremo, gremo s puško na rami
V napad za svobodo, za kruh


Quem são esses jovens
Que marcham pelo vilarejo?
Quem são esses jovens
De quem é o rosto brilhando assim?

Esses são jovens partisans
De espírito inquebrantável
Esses são jovens partisans
Que lutam por um mundo novo

Quem são essas moças
Com rifles sobre os ombros?
Quem são essas moças?
Elas não têm medo algum?

Esses são jovens partisans
Que ouviram a voz do coração
Esses são jovens partisans
Que deixaram o medo em casa

Como é esse jovem exército
Que cantava pelo vilarejo?
Como é esse jovem exército
Diferente de tudo o que havia antes?

Esse é nosso verdadeiro exército
Essa é nossa grande força
Esse é nosso exército de partisans
Que chamam a manhã com seu canto

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Kdo pa so ti mladi fantje
Ki korakajo skoz’ vas?
Kdo pa so ti mladi fantje
Ki jim tak žari obraz?

To so mladi partizani
Neupogljivega duha
To so mladi partizani
Borci novega sveta

Kdo pa so dekleta mlada
Puške imajo na ramah?
Kdo pa so dekleta mlada?
Ali ni jih prav nič strah?

To so mlade partizanke
Slušale so glas srca
To so mlade partizanke
Strah pustile so doma

Kakšna je ta mlada vojska
Ki zapela je skoz vas?
Kakšna je ta mlada vojska
Druga vsa kot prejšnji čas?

To je prava naša vojska
To je silna naša moč
To je vojska partizanska
Jutro znani nam pojoč



terça-feira, 21 de janeiro de 2025

Canções partisans iugoslavas (2)


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Depois da última publicação em 2019 com a tradução de algumas das chamadas “canções partisans” iugoslavas, a maioria em esloveno, enfim estou retomando aquelas cuja letra consegui localizar e que tinham alguma tradução pra outra língua. Infelizmente, o YouTube derrubou meu canal Pan-Eslavo Brasil em agosto de 2021 e, se antes disso eu incorporava aqui os vídeos legendados que eu fazia com essas músicas, agora só tem as letras originais e traduzidas pro português, além dos vídeos com as gravações originais. A maioria dos áudios foi gravada pelo Partizanski pevski zbor (Coral Partisan) da Eslovênia, país que ainda cultiva a memória da resistência antifascista da 2.ª Guerra Mundial, sem por isso achar que “na época do socialismo tudo era melhor”. Algumas canções já foram publicadas separadamente na página ao longo dos anos.

Algumas das canções tecem louvores a Josip Broz, o Marechal Tito, mas a maioria faz referência à resistência contra a invasão nazista. Comecei a me interessar por essas músicas ainda aos 16 anos de idade, quando muito poucos já tinham redes sociais e o YouTube nem existia. Por um acaso, pesquisando nos mecanismos de busca sobre a Iugoslávia socialista, achei na época a rica página Titoville, que funciona até hoje, com fotos, textos e áudios de discursos e canções do período. Confesso que o regime titoísta (1943-91) foi o único pelo qual tive alguma simpatia, mas na adolescência. Na época, eu só escutava as músicas partisans em MP3 no computador, e a partir de 2011 também num velho celular, e sequer sabia que boa parte delas era cantada em esloveno, e não em servo-croata.

Durante a graduação em História, aprendi russo, e algum tempo depois, um pouco de outras línguas eslavas, incluindo as bases do esloveno, mas nunca me aprofundei. Usando agora os múltiplos recursos que a internet oferece, fui traduzindo ao longo dos anos algumas canções iugoslavas em servo-croata e em esloveno. No caso de hoje, encontrei traduções em inglês e italiano, mas as comparei também com o resultado que o Google Tradutor dava em português quando eu jogava o texto em esloveno. Também escolhi usar a palavra partisan em francês, mais adequada ao contexto de 1939-45 e mais abrangente, equivalente ao eslavo meridional partizan (com “z”) e ao italiano partigiano Em francês, significa literalmente “partidário” ou “relativo a partido(s)”, mas evitei “guerrilheiro”, que às vezes é justamente traduzido como partisan fora do contexto europeu, porque a meu ver os partisans eram apenas alguns dos adeptos, como vários em outros tempos e lugares, da “tática de guerrilha”.

A primeira canção se chama Na juriš (Ao ataque), com letra de Tone Seliškar e melodia de Karol Pahor, e segundo a página em que encontrei o original e traduções em inglês e italiano, foi composta em 1943. A segunda se chama Pesem XIV. divizije (Canção da 14.ª Divisão), também conhecida como Zaplovi pesem (A canção navega), cuja letra de Karel Destovnik Kajuh, membro da referida divisão, provavelmente data de novembro de 1943 e que recebeu melodia de Sveto Marolt-Špik. Segundo a página em que encontrei o original e uma tradução pro servo-croata, seu atual formato em estrofes de quatro versos teria sido estruturado pelo compositor Radovan Gobec. E a terceira se chama Vstala Primorska (O Litoral se levantou) ou Vstajenje Primorske (O levante do Litoral), datada de fevereiro de 1944 (segundo a Wikipédia eslovena) e com letra de Lev Svetek-Zorin e melodia de Rado Simoniti. Na página com o original há também traduções em inglês e italiano, mas um comentarista bondoso também publicou outra tradução anglófona no vídeo do YouTube.

Primorska” é uma palavra cognata à russa “primórie” e significa “região costeira”, “litoral” (lit. “junto ao mar”). Designa essencialmente a parte mais ocidental da atual Eslovênia, por isso mesmo mais “de cara” com a Itália fascista que queria subjugar esse povo em definitivo. Com a dissolução do Império Austro-Húngaro, um quarto do território de população eslovena passou pra Itália, que durante o “vintênio fascista” praticou uma italianização forçada, não sem resistência nativa. A invasão de Mussolini levou à anexação completa da Eslovênia, até sua libertação pelos partisans, que também obtiveram esse “quarto faltante”, embora ainda haja minorias eslovenas nos países vizinhos. O litoral esloveno é bastante reduzido e a cidade italiana de Trieste (ou Trst) fica bem na fronteira, tendo sido outrora bem mais eslovena que a própria capital atual, Ljubljana. A península da Ístria, bem protuberante nos mapas e onde fica Pola (Pula), terra natal de Sergio Endrigo, pertence à Croácia.

Recomendo também um material que usei na publicação de 2019 e, em parte, na publicação que vai aparecer amanhã! Esta seção de um portal bem maior contém as traduções de algumas canções iugoslavas, e num fórum de variedades alguém criou um tópico com algumas dessas músicas traduzidas pro inglês. Existe também um rico site com o áudio e a letra de muitos cantos populares eslovenos, mas escrito só na língua local.


Ao ataque, ao ataque, ao ataque
O grito dos combatentes ressoa pelas florestas
As fileiras inimigas são densas

2x:
Bata, ataque, corte, queime
Ao ataque, oh-ei, partisan
O dia da liberdade está diante de você

Ao ataque, ao ataque, ao ataque
Que queimem todas as árvores podres
Que a Terra se transforme em Paraíso

2x:
Que o Sol brilhe pra todos e só brote alegria
Ao ataque, oh-ei, partisan
O dia da liberdade está diante de você

Ao ataque, ao ataque, ao ataque
Vinguemos as casas queimadas
Vinguemos todos os nossos túmulos

2x:
Expulse os furiosos e salve os sofredores
Ao ataque, oh-ei, partisan
O dia da liberdade está diante de você

Ao ataque, ao ataque, ao ataque
Os irmãos oprimidos nos acompanham
Conquistamos sozinhos a liberdade

2x:
Passando fome e dores por uma vida melhor
Ao ataque, oh-ei, partisan
O dia da liberdade está diante de você

____________________


Na juriš, na juriš, na juriš
Krik borcev vihra skozi hoste
Sovragove vrste so goste

x2:
Udari, navali, usekaj, izpali
Na juriš, o-hej, partizan
Pred tabo svobode je dan

Na juriš, na juriš, na juriš
Požgimo vsa gnila drevesa
Zemljo spremenimo v nebesa

x2:
Vsem sonce naj sije, le radost naj klije
Na juriš, o-hej, partizan
Pred tabo svobode je dan

Na juriš, na juriš, na juriš
Maščujmo požgane domove
Maščujmo vse naše grobove

x2:
Preženi besneče in reši trpeče
Na juriš, o-hej, partizan
Pred tabo svobode je dan

Na juriš, na juriš, na juriš
Vsi bratje teptani za nami
Svobodo si vzamemo sami

x2:
Skoz glad in trpljenje v lepše življenje
Na juriš, o-hej, partizan
Pred tabo svobode je dan


1. O canto das lutas e vitórias
Navega por montes e mares
A canção da 14.ª Divisão
Navega pelo mundo
Carrega Tomšič e os espíritos
De Šercer e de Bračič
E por toda a terra eslovena
Ela esquenta nossos corações

Refrão (2x):
À luta, Décima Quarta, ao ataque
Que se espalhe pelo mundo
Ergamos as armas e avancemos heroicos
Sigam o comandante à batalha. Avante!

2. Quando a pátria se reerguer
Dos sofrimentos e da tristeza
Então a Décima Quarta
Vai caminhar triunfalmente
Vai estar entre as primeiras
Na linha de divisões
Que lutaram por dias
Melhores e mais felizes

(Refrão 2x)

____________________


1. Zaplovi pesem borb in zmage preko gmajn, gora
Zaplovi pesem divizije Štirinajste v svet
Ponesi Tomšiča, duh Šercerja, duh Bračiča
Po vsej slovenski zemlji in prekali z njim srca

Refren (x2):
V borbo, Štirinajsta, juriš
Naj se razlega prek sveta
Dvignimo puške in naprej junaško
Vsi za komandantom v boj. Naprej!

2. Ko domovina vstane iz trpljenja in gorja
Takrat bo Štirinajsta zmagovito stopala
Takrat med prvimi bo stala v vrsti divizij
Ki so borile se za boljše in srečnejše dni

(Refren x2)


Tínhamos trancado dentro de nós a dor
Nossa humilhação, nossa raiva
E enterrado bem no fundo do coração
O grito de vingança preso sob os lábios

Mas veja, se abateu uma tempestade fortíssima
E rompeu as correntes do jugo como teias de aranha
E o raiar de um novo dia brilhou novamente
Até as últimas casas do Litoral

As metralhadoras cantaram sua canção
O estrondo dos canhões sacudiu o ar
E os vastos campos estavam em chamas
Um grito de liberdade surgiu entre as florestas

2x:
Você ressuscitou, Litoral, pra uma nova vida
Entra de cabeça erguida numa nova época
Pelas lutas, humilhações, vitórias e sofrimento
Você enfim reencontrou sua verdadeira face

____________________


Nekdaj z bolestjo smo v sebe zaprli
Svoje ponižanje, svoje gorje
Krik maščevanja na ustnih zatrli
Ga zakopali globoko v srce

Toda glej, planil vihar je presilen
Kot pajčevine raztrgal okov
Šinil je zopet žar novega dneva
Tja do poslednjih primorskih domov

Strojnice svojo so pesem zapele
Zrak je pretreslo grmenje topov
Širne poljane so v ognju vzplamtele
Klic je svobode vstal sredi gozdov

x2:
Vstala Primorska si v novo življenje
Z dvignjeno glavo korakaj v nov čas
V borbah, ponižanju, zmagah, trpljenju
Našla si končno svoj pravi obraz



segunda-feira, 20 de janeiro de 2025

Netanyahu fala dos reféns (18/1/2025)


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Primeiro-ministro de Israel, Binyamin (ou Benjamin) Netanyahu comentou no dia 18 de janeiro de 2025 o acordo de cessar-fogo com o Hamas visando à libertação de 33 reféns detidos em Gaza e de 737 prisioneiros palestinos durante os próximos 42 dias. Começando do domingo seguinte, dia 19, três moças já saíram do cativeiro e 95 presos foram libertados, mas não se sabe ao certo quantos desses 33 reféns podem já estar mortos (ou seja, vão ser devolvidos apenas os corpos). O ministro de extrema-direita Itamar Ben-Gvir, hostil a qualquer acordo, anunciou a saída de seu partido da coalização de governo, que agora se mantém com um número mínimo de deputados suficientes no Parlamento.

O discurso à nação, denominado “A libertação dos reféns é uma missão sagrada”, foi transmitido em hebraico no canal oficial do governo, mas em seu site existe também uma tradução em russo do mesmo discurso, a partir da qual fiz a versão em português que estou lançando aqui.


Caros cidadãos de Israel,

Em 7 de outubro, nossos inimigos cometeram o mais terrível assassinato em massa do povo judeu desde o Holocausto. Mas dessa terrível tragédia emergiu a força do espírito de nosso povo, bem como o heroísmo de nossos soldados.

Essa força nos move com a determinação de atingir todos os objetivos de guerra que estabelecemos: resgatar todos os nossos reféns, destruir as capacidades militares e governativas do Hamas e garantir que Gaza não represente mais uma ameaça a nosso Estado.

Nesta guerra pelo reavivamento, mostramos a nossos inimigos – e ao mundo todo – que quando o povo de Israel está unido, não há força que possa nos destruir.

Tenho orgulho de ser o primeiro-ministro de nosso maravilhoso povo. Tenho orgulho de liderar nosso país em tempos como esses.

O gabinete e o governo aprovaram o plano para o retorno de nossos reféns. Este é o objetivo da guerra, ao qual não renunciaremos até alcançá-lo.

Essa missão sagrada de libertar reféns me acompanhou por toda a minha vida: desde meus dias como soldado no Tsahal até meus anos como primeiro-ministro.

Junto com vocês, cidadãos de Israel, e com muitas pessoas ao redor do mundo, minha esposa Sara e eu esperamos, rezamos e atuamos pelo retorno de todos os nossos reféns. Penso neles o tempo todo.

Minha esposa Sara se dedica de corpo e alma ao cuidado das famílias e dos reféns libertados, trabalhando para eles em Israel e no exterior.

Sei que essa preocupação é compartilhada por todas as famílias de Israel. Prometo a vocês: alcançaremos todos os objetivos de guerra. Traremos todos para casa.

Até o momento, resgatamos 157 reféns, 117 dos quais estão vivos. Pelo acordo agora aprovado, traremos para casa mais 33 dos nossos irmãos e irmãs, a maioria deles vivos.

Este acordo é o resultado, antes de tudo, do heroísmo dos nossos soldados em batalha, bem como de nossa firme posição na defesa dos interesses vitais de Israel.

O acordo foi possível graças à cooperação de Israel com a administração do presidente Biden, que está saindo, e a nova administração do presidente Trump.

Assim que foi eleito, o presidente Trump se juntou à missão de libertação dos reféns. Na quarta-feira à noite, ele me ligou, me parabenizou pelo acordo e enfatizou que sua primeira etapa constituía em um cessar-fogo temporário. Foi o que ele disse: “cessar-fogo temporário”.

Para as etapas subsequentes do acordo, mantivemos ativos significativos para resgatar todos os nossos reféns e atingir todos os objetivos da guerra.

Tanto o presidente Trump quanto o presidente Biden apoiaram totalmente o direito de Israel de retomar as hostilidades se o país concluir que as negociações da segunda fase se revelarem infrutíferas. Realmente valorizo isso.

Também valorizo a decisão do Presidente Trump de suspender todas as restrições restantes ao fornecimento de armas e munições vitais para Israel.

Se precisarmos retornar aos combates, faremos isso de novas maneiras e com mais força.

Durante as negociações, defini vários princípios:

O primeiro princípio é manter a capacidade de retomar as hostilidades, se necessário. Durante longos meses, o Hamas vem exigindo que acabemos com a guerra antecipadamente como condição para libertar os reféns. Recusei categoricamente essas condições e minha posição foi aceita.

O segundo princípio é aumentar consideravelmente o número de reféns que estamos resgatando na primeira etapa. Nossa persistência valeu a pena.

O terceiro princípio é manter o controle sobre o Corredor Filadélfia e a zona de segurança. Israel terá controle total sobre esses territórios para impedir o fornecimento de armas ou a remoção de reféns.

Também atacamos inimigos em sete frentes e alcançamos sucessos históricos.

Cidadãos de Israel, a guerra pelo reavivamento exige que tomemos decisões difíceis, mas é aí que entra a verdadeira liderança. Apesar da dor, protegemos nosso povo e garantimos o futuro do nosso país.

Nós venceremos porque o espírito que move nosso povo é indestrutível.

Com a ajuda de Deus, derrotaremos nossos inimigos e garantiremos nosso futuro.

“Há um reavivamento, e há esperança para o futuro.”



domingo, 19 de janeiro de 2025

Discurso de Tito em Split (1962)


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Alguns anos atrás, publiquei aqui o pequeno trecho de um famoso discurso público de Josip Broz, o Marechal Tito, presidente da Iugoslávia socialista, feito na cidade croata de Split, em 7 de maio de 1962. Aludi então à existência de outro vídeo há muitos anos no ar, com um homem fazendo uma breve apresentação e um dos principais trechos do discurso, mas cuja transcrição nunca consegui encontrar na internet. Procurando durante algum tempo, achei alguns fragmentos, em especial do início, mas eles não contemplavam o resto da fala. E mesmo tendo estudado um pouco de servo-croata por algum tempo, nem em 2019 nem em 2025 me sinto capaz de transcrever só de ouvido, até porque às vezes o ditador fala meio rápido.

Soube que em algumas bibliotecas ao redor do mundo, inclusive a de Belgrado, existem exemplares de um Govor na narodnom mitingu u Splitu, o que parece ser a transcrição completa desse discurso publicada logo depois, com leves edições e sem cópias gratuitas online em PDF. Embora eu entenda muito pouco servo-croata, consegui tirar algumas frases de ouvido, e por esses milagres que só parecem acontecer após insights inesperados que a gente tem, ao invés de continuar procurando pelo Google, resolvi procurar pelo Yandex, o buscador russo. Ele é o maior indexador de escrita cirílica do mundo (salvo engano, pois faz muitos anos que ouvi isso), mas não procurei em cirílico, e sim em “latinica”, e mesmo assim caí neste longo artigo historiográfico, croata, que incrivelmente tinha a transcrição quase idêntica daquele primeiro vídeo específico! Tudo bem que a publicação é de 2018, mas mesmo assim me admira que o “onipotente” Google não a tenha indexado, e que eu tenha demorado tantos anos pra encontrá-la...

Mesmo contendo apenas a transcrição do primeiro trecho que legendei, e não deste, que estou apresentando sem legendas, bem como a transcrição de vários outros trechos, deixo à disposição um arquivo em PDF com trechos selecionados daquele livreto (e que tem também uma pequena nota explicativa) e uma página com a mesmíssima transcrição, mas um pouco mais abrangente no final. Num dos comentários desta publicação de um blog, há mais um trecho transcrito e não contido nos textos anteriores, mas sem o vídeo correspondente na internet. A partir da transcrição do site croata, fiz correções pra deixar mais fiel à oralidade, mesmo que isso implicasse manter algumas repetições inúteis, e troquei as palavras em ijekavica pelas formas ekavica equivalentes, usadas por Tito. Depois, joguei no Google Tradutor, corrigi o resultado (usando inclusive o Wiktionary) e padronizei a formatação.

No vídeo abaixo, as únicas modificações que fiz foram tirar a introdução com o senhor falando e recortar o quadro pra dimensão 16:9. Nota linguística: drug (pl. drugovi) e drugarica (pl. drugarice) são respectivamente o masculino e o feminino de “camarada”, que em português é um substantivo de dois gêneros, mas igualmente não, por exemplo, em alemão, que tem Genosse (masc.) e Genossin (fem.). A foto acima, com fins meramente ilustrativos, não é do discurso de Split, mas de algum outro evento parecido. Afinal, vemos que os microfones não são os mesmos e que ele está segurando um chapéu ao invés de um exemplar da revista Crusoé, rs:


Camaradas! Quando falamos aqui hoje sobre mais uma grande conquista de nossos trabalhadores, estamos orgulhosos dela. Estamos orgulhosos de tudo o que conquistamos até hoje. E, de fato, a Iugoslávia renasceu em sua industrialização, e não apenas na industrialização, mas em geral, na construção, em geral na construção! Ela não é mais o que costumava ser.

Vocês sabem que recentemente realizamos uma sessão do Comitê Executivo do Comitê Central da Liga dos Comunistas da Iugoslávia. Devo dizer que é justamente essa preocupação e inquietação com diversas anomalias que nos obrigou a analisar todos esses fenômenos de forma muito precisa, muito, como devo dizer, completa, e a criticar a nós mesmos. E, por Deus, não pouparemos ninguém das críticas. (Aplausos. Multidão canta: “Camarada Tito, nós lhe juramos que não nos desviaremos de seu caminho.”)

Camaradas! E se hoje temos dificuldades objetivas e deficiências objetivas, então elas são resultado de erros subjetivos de nossos dirigentes. (Aplausos) É claro que quando falo sobre os erros subjetivos dos dirigentes, não me refiro a todos. Mas há muitos deles! (Aplausos) E discutimos essas questões, essas mesmas questões entre nós. Eu gostaria, camaradas... (Aplausos. Grito em coro: “Tito é necessário, Tito é necessário...”) Camaradas, quando falo dos erros dos dirigentes, também me refiro à responsabilidade indireta pelo que os outros fizeram. Pois os comunistas também devem responder por tudo, mesmo agora depois da guerra, na construção do socialismo. (Aplausos estrondosos. Grito em coro: “Tito, partido...”)

Por um tempo, por um tempo, houve uma opinião constante: agora os comunistas, com a democracia e a descentralização, eles não têm mais o direito nem o dever de responder pelo desenvolvimento, pelo desenvolvimento interno de nosso país. Isso está errado! Mais uma vez devemos, mais uma vez devemos insistir que os comunistas respondem pelo desenvolvimento do socialismo! E quem mais o fará senão os comunistas?

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Drugovi i drugarice! Kada danas ovde govorimo o jednom opet velikom dostiženju naših radnih ljudi, mi se time ponosimo. Mi se ponosimo sa svime time šta smo postigli do danas. I zaista Jugoslavija je u svojoj industrijalizaciji, i ne samo u industrijalizaciji, nego u opšte, u izgradnji, opšte u izgradnji preporođena! Nije više ono što je bila.

Vi znate da smo nedavno održali sjednicu Izvršnog komiteta Centralnog komiteta Saveza komunista Jugoslavije. Ja moram da kažem da baš ta briga, i ta zabrinutost zbog raznih anomalija nas je prisilila da vrlo oštro, vrlo, kako da kažem, temeljito proanaliziramo sve te pojave i da izvršimo kritiku i sami sebe. A boga mi, nećemo štediti i sa kritikom i svi drugih. (Aplauz. Masa peva: „Druže Tito, mi ti se kunemo da sa tvoga puta ne skrenemo.“)

Drugovi i drugarice! I ako danas imamo objektivnih teškoća, i objektivnih nedostataka, onda su oni rezultat subjektivnih grešaka naših rukovodećih ljudi. (Aplauz) Ja, razume se, kada govorim o subjektivnim grešaka rukovodećih ljudi ne mislim na sve. Ali ih ima ne malo! (Aplauz) I mi ta pitanja, baš ta pitanja smo diskutirali u nas. Ja bih htio, drugovi i drugarice… (Aplauz. Horsko uzvikivanje: „Tito treba, Tito treba…“). Drugovi i drugarice, kako govorim o greškama rukovodećih ljudi, ja podrazumevam tu i indirektnu odgovornost, za ono što su drugi radili. Jer i komunisti moraju biti odgovorni za sve i sada posle rata u izgradnji socijalizma. (Gromoglasan aplauz, horsko uzvikivanje: „Tito, partija…“)

Neko vreme, neko vreme se bilo stalno mišljenje, komunisti sada, demokratija, decentralizacija, i sada oni nemaju više tako, ni pravo, a ni dužnost, da moraju, da odgovaraju za razvoj, za unutrašnji razvoj naše zemlje. To je pogrešno! Ponovno mi moramo, ponovno mi moramo stati na to, da komunisti odgovaraju za razvitak socijalizma! A tko će drugi ako ne komunisti?



sábado, 18 de janeiro de 2025

O “relatório secreto” de Khruschov


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Este é um texto longuíssimo, cujo sonho meu era traduzir direto do russo pro português, um documento histórico muito comentado entre os adeptos e/ou estudiosos do comunismo no Brasil, mas muito pouco conhecido por seu conteúdo. Confesso que o li na íntegra quando escrevi meu TCC sobre seu impacto no Brasil, mas me recordo pouco de cada detalhe. Trata-se do informe (ou “relatório”, conforme a tradução) “Sobre o culto à personalidade e suas consequências”, lido em sessão secreta do 20.º Congresso do Partido Comunista da União Soviética (o PCUS, ou KPSS) em 25 de fevereiro de 1956, apenas a alguns dirigentes de partidos comunistas (governantes ou não) ao redor do mundo e sem a distribuição do texto impresso. O texto contém pesadas críticas à atuação de Stalin enquanto ideólogo, à idolatria que tinha se formado em torno de sua figura (embora o evento tivesse começado com loas a sua memória, pra variar) e a várias de suas ações brutais, como a deportação forçada de povos inteiros durante a resistência ao nazismo e o assassinato injustificado de membros da cúpula partidária.

Representando o PCB, estava Diógenes Arruda Câmara, que seria muito criticado por ter ainda viajado à China antes de voltar ao Brasil, período no qual os comunistas tinham tomado conhecimento do “relatório secreto” por meio da então chamada “imprensa burguesa”. É interessante nos determos um pouco mais na figura de Arruda, admirado por uns, execrado por muitos, sobretudo pelos dissidentes do comunismo, mas inclusive pelo não menos contraditório Luiz Carlos Prestes, então secretário-geral do PCB.

Nascido no interior de Pernambuco, ascendeu à direção do partido durante a chamada “Conferência da Mantiqueira”, reunida na região serrana do Rio de Janeiro em 1943 e que reconstruiu a organização após seu esfacelamento pela perseguição do Estado Novo de Getúlio Vargas. Então, com Prestes preso, mas “aclamado” secretário-geral, a geração dos fundadores e a dos que exerceram a liderança na década de 1930 (numa palavra, os “stalinizadores” do PCB), após terem derrubado a primeira, foram escanteadas por um novo “grupo dirigente” vindo ao Rio ou a São Paulo, em grande parte, das regiões Norte e Nordeste, sobretudo Amazonas, Pará, Bahia (onde o partido era forte) e Pernambuco. Muitos deles, entre os quais o carioca Agildo Barata (pai de Agildo Ribeiro, “humorista” do Zorra), se destacaram nas insurreições militares de novembro de 1935, no movimento antifascista e no combate à ditadura, não raro a partir das piores prisões.

Com seu inconfundível aspecto de leão-marinho (“bolínea de gorfe!!!...”) e seu temperamento rude, Arruda era responsável pela segurança pessoal de Prestes e por todo aparato que isso envolvia. O cargo era tão mais importante quanto, apesar do PCB ser novamente legalizado em 1945 e ter eleito muitos parlamentares em todos os níveis (parte da direção chegou ao Congresso Nacional e Prestes, após anistia política, ao Senado), teve o registro novamente cassado em 1947, e seus eleitos perderam os mandatos em 1948. O presidente fascista Eurico Dutra, após derrubar o próprio mentor com um golpe de Estado e quase melar a transição democrática, seguia à risca a cartilha da “guerra fria”... Nessas condições, se instalou praticamente uma paranoia a respeito da proteção de Prestes, o real líder máximo: ele vivia isolado do resto do mundo e de boa parte da militância, e apenas uns poucos autorizados podiam passar pelo “aparato de segurança”. Enquanto chefe desse aparato, Arruda foi acusado de manter Prestes numa espécie de “cativeiro” e de tiranizar o resto do PCB, censurando publicações, humilhando camaradas, intimidando descontentes por meio de outros “aliados” etc.

Dele se dizia que não era muito conhecido pela inteligência refinada, mas, conforme seu bel-prazer (envernizado como “linha oficial do Partidão”), menosprezava e marginalizava artistas e intelectuais, inclusive Jorge Amado e sua maçante literatura da fase “realista socialista”. Arruda não era, pois, apenas um “pequeno Stalin”, mas também um “pequeno Andréi Zhdánov”, o inculto censor cultural soviético, e o começo de sua ruína se deu justamente na segunda metade de 1956. Ele ainda não tinha voltado do 20.º Congresso, mas o Brasil todo, inclusive o PCB, já estava sabendo do “relatório secreto”, vazado por meio de uma fonte polonesa a diversos jornais americanos, que compraram o texto a preço de banana, e copiosamente traduzido por nossos jornais “limpinhos e cheirosos”. A “discussão interna”, na verdade uma vultosa lavagem de roupa suja com pitadas de autocomiseração masoquista, foi aberta sem o consenso da direção pelos próprios editores da imprensa partidária, e o próprio Prestes semilobotomizado precisou sair de sua toca pra pôr fim à bagunça.

A primeira coisa a se ter em conta é que no “curto século 20” de Hobsbawm, os apparatchiks de qualquer partido comunista não eram grandes teóricos nem conhecedores de Marx, Engels ou sequer Lenin (quanto a Stalin, vinha em frases ou excertos mais edificantes), mas apenas executores de ordens ou, na feliz fórmula de Dainis Karepovs, “encaminhadores de diretivas”. Ou faziam o que e como mandava o PCUS (que tinha a preeminência e, sobretudo, financiava os partidos, mesmo após o fim protocolar da Comintern em 1943), ou rodavam, mecanismo que se reproduzia de alto a baixo na hierarquia interna. Há várias razões por que alguém entrava num partido comunista (tema hoje com farta literatura na Europa!) ou por que saía, mas uma vez dentro, conhecer o esquema e agir nos conformes era condição essencial. Não tinha nada de romântico, muito menos de subversivo. Apesar da constante acusação de “espionagem em prol da URSS”, os comunistas no Ocidente não agiam assim por desvio de caráter, mas por um automatismo que não raro se fixava por meio de lavagem cerebral.

A “lavagem de roupa suja” dentro do PCB consistiu de acusações mútuas e de uma competição pra convencer quem dos camaradas tinha sido “mais stalinista” e “mais autoritário” do que os outros, você mesmo, claro, se fazendo de vítima da “máquina”. Nisso surgiam as “autocríticas” que não raro tomavam a forma de expiação pública hipócrita e verborrágica, e depois do “ataque de bílis” de Agildo Barata, Arruda teria sido um dos que mais teatralizou sua “culpa”. Deveras, seu talento na encarnação do secretário tirânico também se manifestou na interpretação do “eu me arrependo porque não sabia de nada”! O fato de Prestes se manter em isolamento até 1958, quando enfim foi revogado um mandado de prisão preventiva contra ele, no clima menos tenso sob Kubitschek e seu próprio “degelo”, trouxe à tona o açambarcamento da liderança efetiva por outros quadros que falavam em nome do ex-capitão. Pra resumir, sua volta à luz do dia provocou reviravoltas que culminaram no 6.º Congresso do PCB, com a tentativa de se tornar mais “apresentável” a uma sociedade mais amaciada por certas ideias de esquerda, e no ocaso do grupo que incluía Arruda, parte do qual confluiu na formação do PC do B, finalmente crítico da linha soviética.

Sobre o grupo em que Arruda se incluía, devemos ter em conta uma segunda coisa, relativa a uma autocrítica que eu mesmo me faço quando escrevi meu TCC em 2011, mas resultante de uma leitura acrítica do período que qualquer pessoa pouco prevenida pode fazer. Na segunda metade de 1956, o primeiro racha no PCB foi entre os que queriam e os que não queriam abrir uma discussão sobre o “relatório secreto”, pois ele foi longamente considerado uma falsificação, dado o modo como passou a ser conhecido. Quando a barragem se rompeu, houve uma divisão, nas tribunas impressas, entre os que criticavam os antigos métodos (muitos deles deixando o partido) e os que eram mais cautelosos quanto a mudanças, relativizando, inclusive, a probidade de Khruschov ao lançar sua “desestalinização”. Um grupo centrista apelidado de “pântano” preferiu acompanhar o andar da carruagem, ver qual lado tomava a dianteira e esperar de que lado Prestes ficaria. Não o escrevi com tanta incisividade, mas não podemos pensar que era uma luta maniqueísta entre “democratas” e “autoritários”, entre “stalinistas” e “antistalinistas”: havia vários interesses envolvidos, sobretudo o de ganhar a graça do secretário-geral, e o próprio PC do B, quando surgiu, tentou primeiro obter as bênçãos de Moscou.

Um documento chamado “Manifesto de Maio”, com a anuência de Prestes, lançou em 1958 as bases pro aprofundamento dos escrúpulos legalistas do PCB, culminado em 1960, como eu disse, com direito a ruptura e tudo, inclusive dos que já tinham criticado aquele manifesto. É verdade que, embora gestor da “máquina” e das relações com Moscou, Prestes perdia gradualmente seu prestígio junto a parte da militância e a uma geração que não tinha passado pelos encantos de sua “Coluna Invicta” na década de 1920. Quanto a Arruda, após ajudar a fundar do PC do B, se engajou na luta armada, foi preso e torturado, se exilou no Chile e na França e morreu de infarto logo após voltar por conta da anistia política, em 1979. É a essa figura pitoresca que a pernambucana Luciana Santos, atual presidenta do “pseudo” e ministra da Ciência, Tecnologia e Inovação (repito: da Ciência, Tecnologia e Inovação!), teceu em 2014 um panegírico ressaltando apenas as agruras e sumindo com seu passado de “Stalin tropical”...

Spoiler: após a anistia, nova “lavagem de roupa suja” oporia os militantes de base que seguraram o rojão durante a ditadura militar e viram muitos camaradas tombarem a seus lados e Prestes com sua família, que passaram um confortável exílio em Moscou, alheios à realidade brasileira. Simplifico demais, mas no final, o ex-capitão se filiou ao PDT e virou cabo eleitoral de Brizola, o PCB seguiu cegamente Sarney e suas burradas e, com o fim da URSS, Roberto Freire tentaria transformar a sigla num partido social-democrata à la eurocomunismo italiano.

Quanto ao “relatório secreto” em si (o próprio nome já é irônico, dado o destino que tomou), ele não continha grandes revelações, exceto pra quem vivia fora da URSS e foi doutrinado com a visão extremamente edulcorada daquele país. O próprio Khruschov, como já escrevi várias vezes aqui, foi o fiel executor dos expurgos de 1936-38 (o “grande terror”, pra muitos) na Ucrânia, e a própria incorporação da Crimeia da RSFS da Rússia à RSS ucraniana em 1954 pode ter sido um primeiro movimento de “expiação” nesse sentido. De todos os “excessos” que ele relata, ele omite uma grande parte, corta números e isenta pessoas, a começar por si próprio. Apesar dos “méritos”, a culpa sobre todos os males da URSS recai unilateralmente sobre Stalin e seu caráter “desviante” (esquecendo, claro, que o georgiano também é fruto de circunstâncias históricas). Mata-se o morto, segue-se em frente e vira-se a página. O mínimo que se pode dizer é que a “desestalinização” (parcial e, depois em parte, revertida) foi apenas um instrumento na luta de poder da qual Khruschov saiu vencedor, concentrando amplos poderes em torno de si mesmo até o golpe palaciano que o depôs em 1964.

Mesmo assim, nem o lançamento do “relatório secreto” e a “desestalinização”, nem a cessão da Crimeia à Ucrânia (afinal, não revertida em 1991, até a anexação ilegal por Putin em 2014) ainda tiveram sua racionalidade totalmente decifrada. Lembremos que muitos documentos do PCUS dessa época seguem fechados ao público, exceto a alguns seletos historiadores oficiosos com visão bastante parcial e a coletâneas editadas que saem totalmente decepadas e enviesadas. Um tal de Grover Furr, que é professor de literatura inglesa, inventou um livro partidário de cabo a rabo segundo o qual Khrushchev mentiu (é o título), amplamente traduzido na Banânia e que reconfortou os jovens stalinistas sedentos de viés erudito de confirmação. Pra começar, ele diz que não pôs as referências bibliográficas “pra cortar custos”: pelamor, né?

Dado que durante a pós precisei lidar com a historiografia realmente séria, só tive tempo de dar uma olhada, e realmente ele não traz um “argumento” propriamente, só imprecações contra Khruschov. O mais interessante é essa categoria da “mentira”, já que o conteúdo não é inverídico, mas apenas incompleto, e que importa mais entender a luta de poder do que fazer a exegese de um texto cuja probidade é idêntica à de qualquer documento soviético que, obviamente, só diz a si e aos outros o que deseja ser a realidade. E se o ex-líder mentiu, então se devolve a razão a um assassino, imperialista, antissemita, brutal, deslocador de povos, fuzilador dos antigos amigos de Lenin, impositor de metas econômicas irrealistas, péssimo estrategista militar (a despeito do que confabula Ludo Martens) e cúmplice no início da carnificina mundial em 1939-45 junto com Adolf Hitler?

Paro por aqui. Não posso resumir numa publicação uma história tão complexa, e tanto as disputas no PCB quanto o contraditório fenômeno da “desestalinização” merecem a atenção e a pesquisa de quem está me lendo, são instigantes, vale a pena! Sinto muito decepcionar quem finalmente esperava uma tradução direta do russo do “relatório secreto” de Khruschov, mas minha falta de tempo, mesmo que desejasse usar o Google Tradutor pra depois corrigir, me impeliu a lhe deixar algum material já pronto. Primeiro, em meu portfólio podem ser acessados meu TCC e, pra alguns detalhes adicionais sobre a “Conferência da Mantiqueira” de 1943, minha tese de doutorado a partir da base da Unicamp, e pode ser baixado meu relatório de iniciação científica de 2009, que serviu de germe ao TCC. Segundo, aqui mesmo na página há várias traduções interessantes a respeito: um artigo de Branko Lazitch sobre a difusão do documento (1986), o trecho de uma palestra de Stéphane Courtois no qual ele o menciona (2009) e o cinejornal oficial do 20.º Congresso do PCUS.

No volume 2 das memórias de Khruschov publicadas no Brasil em 1971, a íntegra do relatório aparece como um anexo, e o único inconveniente em meu arquivo pessoal é que, além de estar em posição invertida, não teve os caracteres codificados. No caso da preparação de uma edição de fôlego da tradução, eu certamente a usaria pra cotejar. Publicado pela Artenova, o livro foi traduzido por Renato Bittencourt, Aurélio de Lacerda, Wilson Cunha e Juarez Barroso, revisto por Aparício Fernandes e editado por Álvaro Pacheco, a partir da tradução do russo pro inglês feita e organizada por Strobe Talbott. O original em russo, que não poderia faltar, está disponível num site sobre a “guerra fria”, mas há várias outras fontes disponíveis.

Existe também uma tradução online pro francês, embora eu não saiba se seja o mesmo texto publicado como apêndice do livro Autopsie du stalinisme, cujo autor usou o pseudônimo “A. Rossi” (Paris: P. Horay, 1957). Ele também contém o posfácio “Les joyeux butors du Kremlin”, de Denis de Rougemont, e pra quem tem acesso à Unicamp, ele está na Coleção Mauricio Tragtenberg (cujos itens não circulam) da biblioteca da Faculdade de Educação, sob o número de chamada 947.0842 T181a.



Uma das cópias do original em russo que circulou livremente por algum tempo em certos jornais da URSS, num experimento que saiu do controle e logo foi interrompido pelo Kremlin.

sexta-feira, 17 de janeiro de 2025

Silvio Santos vem aí (em esperanto!)


Endereço curto: fishuk.cc/silvio-eo


E hoje termino minha coleção de canções traduzidas pro esperanto! Elas são duas, pois uma é muito curta, e da outra não gostei muito, sobretudo porque arrisquei a elisão não muito comum do “e” inicial do verbo “esti” (ser, estar, haver) em vários pontos. A primeira musiquinha, Silvio Santos vem aí, cujo autor é Archimedes Messina, é a abertura do longevo programa dominical do SBT, ao qual o apresentador deu seu próprio nome.

Silvio Santos era o nome artístico de Senor Abravanel, falecido em 2024, empresário que também era proprietário do SBT e um dos maiores comunicadores da história da TV brasileira. Outra tradução possível pro esperanto seria Silvio Santos venas tuj, mas finalmente escolhi Silvio venas tien ĉi, pois o significado literal é mais parecido com o da expressão “vem aí”. A segunda canção, La più bella del mondo (A mais bela [mulher] do mundo), traduzi do italiano como La tutmonda beleco (A beleza mundial). Seu compositor é Mariano Marini e a conheci na voz de Nicola di Bari. Sua data de tradução é 28 de julho de 2003, mas não tenho a data de tradução de Silvio venas tien ĉi.


Kaj hodiaŭ mi finas mian kolekton de kanzonojn tradukitajn al Esperanto! Ili estas du, ĉar unu estas tre mallonga, kaj la alia ne tre plaĉis al mi, ĉefe ĉar mi riskis la ne tre oftan elizion de la komenca “e” de la verbo “esti” en pluraj punktoj. Per la unua kanteto, Silvio Santos vem aí, kies aŭtoro estas Archimedes Messina, komencas la longdaŭra ĉiudimanĉa TV-programo de la brazila kanalo SBT, al kiu ĝia prezentisto donis sian propran nomon.

Silvio (Silvjo, aŭ “siŭvju”) Santos estis la artonomo de Senor Abravanel, mortinta en 2024, entreprenisto, kiu ankaŭ estis la proprietulo de SBT kaj unu el la plej grandaj komunikistoj de la historio de la brazila televido. Alia ebla traduko estus Silvio Santos venas tuj, sed mi fine elektis Silvio venas tien ĉi, ĉar la laŭlitera signifo pli similas al la esprimaĵo “vem aí” (ŝ/li baldaŭ alvenos). La duan kanzonon, La più bella del mondo (La plej bela [virino] de la mondo), mi tradukis el la itala kiel La tutmonda beleco. Ĝia komponisto estas Mariano Marini kaj mi ekkonis ĝin per la voĉo de Nicola di Bari. Ĝia tradukdato estas la 28-a de julio 2003, sed mi ne havas la daton de Silvio venas tien ĉi.


Silvjo venas tien ĉi

2x:
La, la, la, la,
la, la, la, la,
la, la, la, la,
la, la, la, la, la, la.

Nun estas horo
De la ĝojado:
Ridu ni dum la kantad’!
El mond’ forportas ni nenion,
Ridu ni dum la kantad’!

2x:
La, la, la, la,
la, la, la, la,
la, la, la, la,
la, la, la, la, la, la.

Silvjo venas tien ĉi! (3 fojoj)

____________________


2x:
La, la, la, la,
la, la, la, la,
la, la, la, la,
la, la, la, la, la, la.

Agora é hora
De alegria:
Vamos sorrir e cantar!
Do mundo não se leva nada,
Vamos sorrir e cantar!

2x:
La, la, la, la,
la, la, la, la,
la, la, la, la,
la, la, la, la, la, la.

Silvio santos vem aí! (3 vezes)


La tutmonda beleco

Vi ’stas por mi la tutmonda beleco
Kaj am’ kun profundeco portas al vi.
Vi ’stas por mi infanino magia,
Kiel printempo dia por mia kor’.

Rideto lumigata
Sur dolĉa mien’ kata
Kaj sinceraj okuloj
Parolantaj pri am’.

Vi ’stas por mi la tutmonda beleco
Kaj am’ kun profundeco portas al vi.

Ĉio vi ’stas por mi!

____________________


Tu sei per me la più bella del mondo
E un amore profondo mi lega a te.
Tu sei per me una cara bambina,
Primavera divina per il mio cuor.

Splende il tuo sorriso
Sul dolce tuo bel viso
E gli occhi tuoi sinceri
Mi parlano d’amor.

Tu sei per me la più bella del mondo
E un amore profondo mi lega a te.
Tutto, tu sei per me!


quinta-feira, 16 de janeiro de 2025

“Ĥimertrajno” (Trem da saudade)


Endereço curto: fishuk.cc/himertrajno

Eu traduzi esta música do português pro esperanto em 1.º de julho de 2003 e nunca publiquei o texto porque não tinha uma versão em áudio do original. Seu título é Trem da saudade, mas traduzi em esperanto como Ĥimertrajno (Trem da quimera). A primeira vez que escutei foi pela fita K7 de um álbum do cantor Sérgio Tasca, que usou então o nome “Sérgio Rafael”, mas hoje atua como “Sérgio Estrada”. Na capa da fita, a qual não possuo mais, estava escrito que uma tal “Meiricler” compôs a canção, mas é impossível achar mais informações sobre ela. O estilo é a guarânia paraguaia, também chamada “pumbasy”, e estou em contato com o Sérgio pra saber se é possível obter uma versão digital ou em CD desse álbum tão velho, mas tão bonito.

Mi tradukis ĉi tiun kanzonon el la portugala al Esperanto la 1-an de julio 2003 kaj neniam publikigis la tekston, ĉar mi ne havis aŭdian registron de la originala versio. Ĝia titolo estas Trem da saudade (Trajno de la saŭdado), sed mi Esperantigis ĝin Ĥimertrajno. Mi unue aŭskultis la registron per la sonkaseda versio de albumo de la brazila kantisto Sérgio Tasca, kiu tiam uzis la nomon “Sérgio Rafael”, sed hodiaŭ laboras kiel “Sérgio Estrada”. Sur la kasedo, kiun mi ne plu posedas, oni legis, ke “Meiricler” (virina nomo) komponis la kanzonon, sed estas neeble trovi pluajn informojn pri ŝi. La muzikstilo estas paragvaja “guarania” aŭ “pumbasy”, kaj mi estas en kontakto kun Sérgio por ekscii, ĉu estas eble obteni ciferecan aŭ KD-version de la tiel malnova, sed tiel belsona, albumo.


Ĥimertrajno

1. Antikvaj memoraĵoj en brust’ mia tuj vekiĝis,
Malnova sento, kiu pensis mi, ke estingiĝis:
Ĝi estis am’ grandega,
Eĉ mi ne povis teni,
Ĉarmaĵoj de mil noktoj, kiuj dum tag’ unu
Min fortege prenis.
Saŭdad’ hodiaŭ ploras en l’ okuloj larmiĝitaj
Vidanta ĥimertrajnon de la aĵoj jam pasitaj.
En la staci’ de l’ tempo,
Post forta atendad’,
Rigard’ serena via min ektrovas dum de
La trajn’ la haltad’.

Rekantaĵo:
Ho, trista kor’,
Mankante punas l’ am’ al ni!
Ho, trista kor’,
Vundigaj pensoj tre ŝajnas mani’!
Ho, trista kor’,
Bedaŭre finiĝis la sonĝ’;
Ĝuste por ni
Nur lamentkrioj estas daŭra son’.

2. Sed ĉu ŝi primemoras, kiel mi, amtagojn tiujn
Aŭ min forgesis per la brakoj de iu ajna vir’?
Ĉu estas ŝi maljuna?
Ŝi estas kie, Di’?
Melankolio ploras
Kaj revenon petas
Al ŝi l’ melodi’.

(Rekantaĵo)

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1. Recordações antigas acordaram no meu peito,
Um velho sentimento que eu julgava superado:
Era um amor tão grande
Que nem em mim cabia,
Recordações e encantos de mil e uma noites
Que eu vivi num dia.
Hoje, a saudade chora nos meus olhos marejados
Vendo o trem da saudade com destino ao meu passado.
E na estação do tempo,
Logo que o trem parar,
O teu olhar sereno sei que à minha espera
Ali deve estar.

Refrão:
Ai, coração,
Que falta esse amor nos faz!
Ai, coração,
Essa saudade castiga demais!
Ai, coração,
Que pena que o sonho acabou
E pra nós dois
Só a saudade foi o que restou.

2. Será que ela recorda como eu aqueles dias
Ou se esqueceu de mim nos braços de um amor qualquer?
Será que está mais velha?
Meu Deus, onde andará?
Chora, saudade, chora,
E a guarânia implora
Pra ela voltar.

(Refrão)



quarta-feira, 15 de janeiro de 2025

“Grandega amo” (And I love her)


Endereço curto: fishuk.cc/grandega

Eis outra tradução minha de uma canção pro esperanto, ainda não publicada, que fiz em 9 de janeiro de 2003, mas que hesitei em divulgar, porque não achei o texto bastante inteligente. É a canção And I Love Her (E eu a amo), de John Lennon e Paul McCartney, a qual renomeei Grandega amo (Amor enorme). Pra traduzir pro esperanto, também aproveitei as versões em espanhol (Mi gran amor le di) e em português (Eu te amo), então, de certa forma, ela é um “híbrido” dessas três línguas, rs. O vídeo tem a versão gravada por Julio Iglesias.

Jen alia ankoraŭ nepublikata traduko mia de kanzono al Esperanto, kiun mi faris la 9-an de januaro 2003, sed mi hezitis disvastigi ĝin, ĉar mi ne trovis la tekston sufiĉe inteligenta. Ĝi estas la kanzono And I Love Her (Kaj mi ŝin amas), de John Lennon kaj Paul McCartney, kiun mi renomis Grandega amo. Por Esperantigi ĝin, mi ankaŭ profitis la versiojn en la hispana (Mi gran amor le di) kaj la portugala (Eu te amo), do, iumaniere, ĝi estas “hibridaĵo” de tiuj tri lingvoj, hehe. La video havas la versiojn registritan de Julio Iglesias:


Grandega amo

Mi tro amadis vin,
Nur faris tion,
Sed vi ne volas min;
Vi estas ĉio!
Mi vin amas.
Karesojn donis mi
Kaj mi vin kisis.
Ĉe l’ amo, frenezaĵ’,
Mi ne forgesis.
Mi vin amas.

Grandega am’
Ekzistas ne,
Eterna ja,
Sen pere’.

Min helpos la stelar’
Vin rekonkeri.
Kun maltrankvila kor’
Mi tion verkis:
“Mi vin amos”.

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I give her all my love
That’s all I do
And if you saw my love
You’d love her too
And I love her.
She gives me everything
And tenderly
A kiss my lover brings
She brings to me
And I love her

A love like ours
Could never die
As long as I
Have you near me

Bright are the stars that shine
Dark is the sky
I know this love of mine
Will never die
And I love her



terça-feira, 14 de janeiro de 2025

“Hispana knabino” (Spanish girl)


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E aqui está minha verdadeira primeira tradução de uma música pro esperanto, mas não a fiz a partir do português, e sim do espanhol! Quando eu tinha meu hoje extinto site de esperanto, eu a publiquei, mas depois não achei que fosse interessante a republicar nesta nova página. Finalmente, com o objetivo de divulgar praticamente todas as minhas traduções de canções, independente de sua qualidade, estou as publicando aqui esta semana. Hoje você tem Spanish girl, gravada pelo grande Julio Iglesias e cujos compositores são ele mesmo, M. de la Calva e Ramón Arcusa. O novo título em esperanto é Hispana knabino ou, conforme a métrica, Hispana knabino.

De fato, por ter sido a primeira, não tenho a data exata, mas certamente ela apareceu em meados de 2002. A primeira tradução datada é de dezembro de 2002, e durante aquele ano considero que realmente consegui aprender o esperanto (eu tinha 14 anos), embora eu tivesse conhecido a língua em 2000. E talvez achei interessante que uma das maneiras de praticar a língua pra não esquecer (eu aprendi sozinho e não havia outros esperantistas em minha cidade) fosse traduzir música! Através dos anos, apareceram outras, e eis aquela que começou toda a minha história com o esperanto e minhas canções preferidas...


Kaj jen mia vera unua traduko de kanzono al Esperanto, sed mi ne faris ĝin de la portugala lingvo, sed de la hispana! Kiam mi havis nun estingitan retejon pri Esperanto, mi ĝin publikigis, sed poste mi ne pensis, ke estus interese ĝin republikigi en ĉi tiu nova paĝo (blogo). Finfine, kun la celo disvastigi praktike ĉiujn miajn kanzonajn tradukaĵojn, sendepende de ilia kvalito, mi publikigas ilin ĉi-semajne. Hodiaŭ vi havas Spanish girl, registrita de la granda hispana kantisto Julio Iglesias kaj kies komponistoj estas li mem, M. de la Calva kaj Ramón Arcusa. La nova Esperanta titolo estas Hispana knabino aŭ, laŭmetrike, Hispana knabin’.

Fakte, ĉar ĝi estis la unua, mi ne havas la precizan daton, sed certe ĝi aperis ĉirkaŭ la mezo de 2002. La unua traduko kun dato estas de decembro 2002, kaj dum tiu jaro mi konsideras, ke mi vere sukcesis lerni Esperanton (mi estis 14-jaraĝa), kvankam mi ekkonis la lingvon en 2000. Kaj verŝajne, mi trovis interese, ke unu el la manieroj praktiki la lingvon por ne forgesi (mi lernis ĝin sola kaj ne estis samideanoj en mia urbo) estus traduki muzikon! Tra la jaroj, aliaj aperis, kaj jen tiu, kiu komencis ĉiun mian historion kun Esperanto kaj miaj preferataj kanzonoj...


Hispana knabino

Ŝi ĉiam paŝas tre bele,
L’ okuloj ŝiaj vidas tre cele.
Se ŝi ridetas, ĉarmas min,
Ho, ho, ho, hispana knabin’.
Dum plibonigas l’animon,
Rapide ŝi estingas la timon.
La propran volon amas ŝi,
Ho, ho, ho, hispana knabin’.

Ĉarmigis mi tuj en l’ unua nia trov’,
Ne volas mi kondukti kiel stulta bov’.
Nun estas mi feliĉa tre,
Rideti povas mi al ŝi,
Jam estas granda la pasi’.

Ŝi estas monto kaj maro,
Ŝi estas pluvo, vento, stelaro,
Ŝi estas mia bela sonĝ’,
Ho, ho, ho, hispana knabin’.

Ŝi estas nokto, vespero,
De la kuraĝo, ŝi estas ero,
Al ŝi, mi estas fidelec’,
Ho, ho, ho, hispana knabin’.

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Su caminar tan seguro,
Sus ojos claros como ninguno
Y una sonrisa a flor de piel,
Oh, oh, oh, spanish girl.
El alma llena de orgullo,
Con un carácter simepre tan suyo
Y esa manera de querer,
Oh, oh, oh, spanish girl.

Me enamoré al verla por primera vez
Yo que juré ya nunca más volverlo a hacer
Y desde entonces soy feliz,
De nuevo he vuelto a sonreir,
Yo nunca había querido así

Ella es mi mar, mi montaña,
Ella es mi tempestad y mi calma,
Ella es un sueño de mujer,
Oh, oh, oh, spanish girl.

Ella es mi noche y el alba,
Ella es coraje para mi alma,
Mi vida y yo su amante fiel,
Oh, oh, oh, spanish girl.