Se esta publicaçãozinha servir de consolo, já que sei muito pouco da língua georgiana, a crise política na Geórgia gerou, a meu ver, pelo menos um meme linguístico. Foi na edição noturna de 30 de novembro de 2024 do Moambe (lit. “O Narrador”), jornal que passa ao vivo na conta do YouTube do Canal 1 (Pirveli Arkhi), o qual, embora seja de propriedade pública (estatal), faz oposição ao atual governo do partido Sonho Georgiano.
Pra quem não esteve na Terra desde meados ou fins de outubro, uma súmula: o partido Sonho Georgiano, presidido pelo oligarca Bidzina Ivanishvili (que fez sua fortuna na Rússia), embora fosse criado com uma linha pró-UE, tomou progressivamente o caminho da colaboração mais estreita com Putin e da adoção de leis que contrariam o espírito daquela união (contra os direitos das mulheres, as comunidades de gênero, os críticos do governo etc.). Tendo à frente o primeiro-ministro Iracle Cobacri... Cobaquídzi...
Irakli Kobakhidze (enfim, o “Milei do Cáucaso”), o “Sonho” é inimigo ferrenho do Movimento Nacional Unido, partido ainda pró-europeu do ex-presidente Mikheil Saakashvili (então jovem líder da “Revolução das Rosas” em 2003), o qual se encontra em prisão hospitalar sob acusações de corrupção.
No fim de outubro de 2024, embora boa parte da opinião estivesse voltada contra o governo, ele ganhou as eleições parlamentares com maioria absoluta, sob suspeitas de fraude escancarada e perseguição a opositores. A presidente da República (que tem menos poderes do que o premiê e é eleita pelo Parlamento), Salome Zurabishvili, é contra Moscou e a favor dos protestos, e deveria deixar o cargo no início de 2025, mas se recusa, por considerar ilegítima a nova legislatura. No fim de novembro, a crise chegou ao ápice com o “Sonho” suspendendo até 2028 (segundo diz) as negociações pra entrar na UE, o que somou ainda mais raiva aos manifestantes já opostos às fraudes e os segurou nas ruas durante toda a semana que passou. A noite e a madrugada deste domingo (na capital Tbilisi estão 7 horas a mais que Brasília) foram de protestos violentos e insistentes.
A comparação com a Ucrânia de 2014 é inevitável, tanto mais que dois territórios ao norte da Geórgia e etnicamente não georgianos (a Abecásia e a Ossétia do Sul) estão ocupados pela Rússia desde o fim da URSS, e embora se declarem independentes, quase ninguém no mundo os reconhece. Apesar disso, Kobakhidze descarta uma repetição do “Euromaidan” e se recusa a convocar novas eleições. O impasse pode ter repercussões internacionais, e é bom os nerds em geopolítica acompanharem (de preferência, não em mídias que puxem muito pro lado do Kremlin ou de Bruxelas).
Mas um dos manifestantes irados conseguiu em rede nacional berrar por nove minutos seguidos, em tom sempre crescente, contra o governo e quase sem interrupções (há umas quedinhas de sinal também), num georgiano que naturalmente já parece um som de xingamento... Não sei de quem se trata (nem o cara de óculos e cachecol), não entendi patavinas, mas segue o trecho que consegui destacar pra sua diversão:
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Deixe suas impressões, mas não perca a gentileza nem o senso de utilidade! Tomo a liberdade de apagar comentários mentirosos, xenofóbicos, fora do tema ou cujo objetivo é me ofender pessoalmente.