Este programa especial de fim de ano na antiga Checoslováquia comunista, o Gramohit, apresentava as músicas que faziam mais sucesso a cada ano. A edição de 1967, por exemplo, é uma fábrica infinita de memes, como talvez a de outros anos. Além das animadas e bonitas músicas de Pavel Novák, não pude deixar de traduzir e legendar uma canção cômica executada por Jiří Šlitr (1924-1969), um de seus compositores junto com Jiří Suchý (n. 1931). Ela se chama Co jsem měl dnes k obědu (O que comi hoje no almoço), e embora o tema seja bem banal, a graça está na letra estrambólica e na ausência de pausas entre os rápidos versos. A música mesma foi lançada em 1965.
Šlitr e Suchý, às vezes conhecidos como “os Jiří”, realizaram grandes parcerias que influíram fortemente no teatro e música populares checos da década de 1960. Apareceram juntos nos filmes Bylo nás deset (Éramos dez, 1963) e Kdyby 1000 klarinetů (Se 1000 clarinetes, 1964), e em 1968 Šlitr reencenou sua peça Ďábel z Vinohrad (O diabo de Vinohrady, 1966) como resposta ao esmagamento da Primavera de Praga. Juntos “os Jiří” também assinaram naquele ano o Manifesto das Duas Mil Palavras, anticomunista, redigido por Ludvík Vaculík.
Embora não fatigante, traduzir essa canção me exigiu baita pesquisa! São citados vários nomes e comidas e pratos: alguns só existem na Chéquia e na Eslováquia ou nos países ao redor; outros até existem no Brasil ou têm nome em português, mas são bem raros no consumo diário. Alguns pratos checos, com pouca variação, também são consumidos na Alemanha e entre nossa imigração alemã: por isso usei os nomes alemães, mas com o plural em “s”, e não original, pra simplificar. Outros eu apenas adaptei pra coisas mais conhecidas, por isso a letra parece não fazer sentido, até porque a intenção foi mais zoar mesmo, e não passar coerência lógica. Em muitos pontos foi preciso adaptar, mas acredito que o espírito de diversão foi passado!
O pessoal é capaz de fazer piada com o comunismo, dizendo que lá devia haver “fome”, embora a Checoslováquia fosse relativamente rica, e por isso os Jiří faziam uma apologia à comida... Engraçado é que Šlitr consegue segurar o ar durante o canto, mas a prisão favorece depois esse “efeito especial" no fim! Eu mesmo traduzi e legendei direto do checo, copiando este texto que precisou de umas correções. Eu cortei essa versão do programa Gramohit, mas há também esta gravação mais longa feita ao vivo no Teatro Semafor.
A segunda canção é Její láska (O amor dela), uma tradução do schlager alemão gravado em 1965 por Drafi Deutscher, Marmor, Stein und Eisen bricht, e lançada pelo cantor Jaromír Mayer em 6 de janeiro de 1967. A letra original foi escrita por Günter Loose, a melodia composta por Christian Bruhn, e a versão checa criada por Ivo Fischer, letrista nacional muito célebre. Mayer nasceu em Praga em 1943, ainda sob o domínio nazista, e em 1986 emigrou pra Alemanha Ocidental, e depois pro Canadá. Devido a problemas vocais, há muitos anos já não canta, mas tinha uma banda no Canadá, na qual tocava ocasionalmente. Marmor, Stein... chegou a estar no topo das paradas da antiga Alemanha Ocidental, e até mesmo nos EUA recebeu uma versão em inglês, Marble Breaks and Iron Bends.
O primeiro vídeo é do mesmo Gramohit em 1967, no qual ele parece um clone do deputado estadual paulista Frederico D’Ávila. Eu mesmo traduzi direto do checo utilizando esta página como fonte, e também legendei e cortei o quadro, repetindo a própria canção.
No segundo vídeo, legendei a canção inteira, incluindo as estrofes que eu já tinha traduzido no outro vídeo, mas ficaram fora das legendas. E eu mesmo também procurei as fotos na internet e fiz a montagem.
Imaginem, imaginem
Knödels com couve,
Vocês estão vendo,
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Knedlíky se zelím,
To koukáte, to koukáte,
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Adendo (19/5/2024): Achei esta apresentação de Jaromír Mayer muito por acaso, dublando no fim de março de 2024 Její láska em playback no programa eslovaco Hudba bez hraníc (Música sem fronteiras), que também traz justamente muitos antigos astros checos, relembrando quando a Checoslováquia era um só país. Embora, como podemos ver bem no fim do vídeo, sua voz esteja muito longe daquela dos áureos tempos, ele também aparece em outros vídeos do canal recordando outros sucessos e até dando uma pequena entrevista. Recomendo uma visita, pra ver como está Mayer hoje:
1. No mínimo por um ano e meio,
Refrão:
2. Aí eu quis comprar pra loira Cris,
(Refrão 2x) 3. Quem tenho agora fora Paulinha,
4. O amor dela ignora limites,
O amor dela ignora limites,
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Refrén:
2. Pak jsem chtěl pro blond Kristýnku,
(Refrén 2x) 3. Co mám teď ale Pavlínu,
4. Její láska nezná mez,
Její láska nezná mez,
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