domingo, 5 de outubro de 2014

União fraternal das repúblicas soviéticas


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Lev Davidovich Bronstein (Leon Trotsky) à frente do Exército Vermelho.


Introdução (Erick Fishuk)

Logo após a Revolução Russa bolchevique de outubro de 1917 (houvera ainda a de fevereiro, quando os revolucionários, não apenas bolcheviques, derrubaram o tsar), a anarquia governamental permitiu que vários povos do antigo império se desmembrassem territorialmente por conta própria, ao menos de forma temporária, algo visto como um grande prejuízo pelos comunistas que haviam acabado de tomar o poder. Um dos maiores problemas com que teóricos como Vladimir Lenin (1870-1924) se depararam foi o de como manter a unidade do imenso país, mas ao mesmo tempo garantir a autodeterminação às nacionalidades antes oprimidas pela secular monarquia, autodeterminação que sempre foi uma das principais bandeiras dos movimentos socialistas em geral.

Outro grande desafio para os bolcheviques, desde 1918, era a guerra civil que estavam travando contra seus opositores domésticos armados e contra as potências capitalistas estrangeiras contrárias à consolidação do poder comunista na Rússia. Nesse contexto, Leon Trotsky, dirigente do Exército Vermelho, ainda contando com grande poder e influência, gravou um discurso a respeito dessa questão das nacionalidades, em que ressalta a importância da união de todos os povos locais para a derrubada do tsarismo e a construção de uma nova sociedade, até chegar à aliança internacionalista com outros países que então viviam processos revolucionários semelhantes.

Apresento aqui a tradução que fiz do discurso, oficialmente chamado “A união fraternal das repúblicas soviéticas” (em russo, “Bratski soiuz sovetskikh respublik”) e gravado em abril de 1919, num dos raros registros da voz de Trotsky. O material foi divulgado pela primeira vez no Blog Convergência, graças à iniciativa e apoio do professor e militante Alvaro Bianchi, da Unicamp. O texto original em russo pode ser encontrado nesta página, ou em versão equivalente do site SovMusic, onde também se pode baixar o áudio.

Como se vê abaixo, também disponibilizei uma cópia do vídeo com o áudio e algumas imagens, que legendei em português. Ressalto que a legendagem exige algumas adaptações em relação ao texto escrito destinado à leitura.


[A união fraternal das repúblicas soviéticas. Discurso do Comissário do Povo para Assuntos Militares e Navais, (1) camarada Trotsky.]

Camaradas!

A velha Rússia tsarista era um todo firmado pelos aros férreos da violência e do despotismo. Em meio à brutalidade da última guerra mundial, esses aros foram rebentados, bem como se fez em pedaços o antigo regime monárquico.

E muitos pensaram que os povos da velha Rússia tsarista se apartariam para sempre. Mas eis que às nossas vistas se dá um grande prodígio histórico: o Poder Soviético está os dispondo numa sólida e harmoniosa união.

As tropas soviéticas libertaram Kharkov e Kiev. (2) Mas e daí? O povo ucraniano quer afinal conduzir sua existência à parte do restante da Rússia Soviética?! Não, ele quer uma união fraternal comum mantida por laços indissolúveis.

Os regimentos soviéticos libertaram Riga e Vilno. (3) Mas e daí? O povo letão, o povo lituano e o povo bielo-russo desejam afinal que uma muralha de pedra os separe de nós?! Não, eles querem uma união fraternal estreita.

E o mesmo ocorrerá amanhã à Estônia, ao Cáucaso, à Sibéria e a todos os territórios do antigo império tsarista ainda hoje desmembrados.

Isso mostra que no coração dos povos trabalhadores reside um desejo inabalável de combinar suas forças.

Onde o ferro e o sangue firmavam o império tsarista, aí também o povo, no íntimo de sua consciência, desejava uma existência fraternal e livre, sem guerras, disputas ou hostilidades de uma nação com outra. Hoje, tendo recebido a direção do Estado em suas mãos por intermédio do Poder Soviético, o povo trabalhador está edificando uma nova Rússia, soviética e federativa.

E essa Rússia Soviética estende suas mãos à nova Alemanha em surgimento, para que todos os povos transformem o mundo numa república soviética unida!


Notas (Erick Fishuk)

(1) Na legenda do vídeo, como é natural nesse tipo de texto, o título foi abreviado para “Comissário de Guerra e Mar”, sem prejuízo da compreensão.

(2) Cidades hoje conhecidas pelos nomes em ucraniano, “Kharkiv” e “Kyiv”, e não por essas denominações russas.

(3) “Vilno” (de 1919 até 1939) e “Vilna” (até 1918) eram nomes russos da que hoje é conhecida pelo nome local “Vilnius”, capital da Lituânia.



Cavalaria do Exército Vermelho em 1920.