domingo, 7 de maio de 2023

MDB no documentário e na realidade


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Achei por acaso este documentário institucional muito interessante e instrutivo, que parece ter sido inserido em outros vídeos de propaganda específicos de cada estado (neste aparece o Rio Grande do Sul ao final). Ele se chama Do MDB ao PMDB: uma história de Brasil, e parece ter sido produzido no finzinho da década de 1990 (comecinho dos 2000, no máximo, mas acho que não). Embora tenha obviamente o ponto de vista enviesado (como todo documentário encomendado), apagando vários momentos obscuros em que o PMDB esteve envolvido na Nova República (a partir de 1985), me parece muito instrutivo e, sobretudo, gostoso de ser visto, por ter várias cenas históricas de época.

Claro que dá nojinho ver figuras repulsivas nas imagens, como Sarney, Quércia, Barbalho, Temer e Renan Calheiros, mas é interessante os muitos adolescentes e adultos jovens que, com a infinidade do YouTube, veem como se vivia antes do “terceiro milênio”, época que ainda peguei como criança. (Inclusive, me lembro até de vários acontecimentos políticos, como a aprovação da emenda da reeleição.) Após o golpe militar de 1964, os partidos foram extintos e foi instituída uma bizarrice chamada “bipartidarismo”: eram criados em 1966 a ARENA (Aliança Renovadora Nacional) como sustento ao regime e o MDB (Movimento Democrático Brasileiro) pra fazer uma espécie de oposição domesticada. Contudo, liderado por Ulysses Guimarães, o MDB acabaria muitas vezes saindo do controle dos militares e até vencendo eleições que, assim, “forçavam” a alteração das regras do jogo eleitoral pelo alto.

A promulgação da Lei da Anistia em 1979 foi o primeiro capítulo do desmonte da ditadura, restabelecendo, portanto, o multipartidarismo, mas ainda em condições que desfavorecessem a oposição. Por exemplo, obrigou-se todos os partidos a portarem “P” (Partido) no início do nome, e várias siglas pequenas foram criadas (em torno do PDS, Partido Democrático Social, novo nome da ARENA) pra desviar a atenção dos opositores. O regime pensava que, assim, o povo desassociaria os novos nomes das velhas forças, mas no fim PMDB (Partido do Movimento Democrático Brasileiro, não deixando de ser bizarro um “partido do movimento”) conseguiu “colar”. Os partidos que citei acima (como o PDS, que anos depois virou o PP, hoje Progressistas, antiga casa de Bolsonaro) formaram o núcleo do que, durante a Constituinte de 1988 e até hoje, chamamos de “centrão”, o grupo fisiológico sem ideologia que ajuda a arrebanhar votos (quase sempre em troca de algum favor) pra aprovação de projetos pelo Planalto.

Atualmente, por não ter uma ideologia clara e ser considerado “partido pega-tudo” (omnibus party em inglês), o PMDB (que voltou a ser MDB em 2017, durante o governo Temer) também é considerado parte do “centrão” e acolheu vários antigos cúmplices da ditadura que “mudaram de lado”, como o próprio presidente Sarney. Notável que a primeira mudança de nome tinha por objetivo prejudicar os opositores, mas a segunda, alegando “retorno às origens”, visava limpar a imagem manchada pela corrupção, rs.

Existe até uma piada segundo a qual quando a Dilma caiu, o PMDB empossou seu terceiro presidente “sem voto” (vices, na verdade: Sarney, Itamar e Temer), e por isso podia pedir música no Fantástico! Atualmente, sem empolgar nem atrair multidões e como parte das mudanças democráticas naturais, o MDB tem perdido espaço nos Legislativos. Contudo, ainda mantém importantes estados e municípios, e segue sendo “fiel da balança” em votações decisivas.

Do vídeo original, apenas cortei os trechos específicos ao Rio Grande do Sul e aumentei o volume. Espero que vocês entendam esse meu esforço por resgatar a história recente do Brasil e ensiná-la às futuras gerações!


Ri muito descobrindo este vídeo por acaso, e tirei os trechos em que aparece o candidato Fleury, pois de resto se aplica direitinho à atualidade! O ator Chiquinho Brandão, falecido num acidente de carro em 1991, participa da campanha eleitoral de Luiz Antônio Fleury Filho (1949-2022), então do PMDB, ao governo do estado de São Paulo em 1990. O próprio vídeo se afirma como um “manual do boqueiro”, ou seja, da prática da boca-de-urna no dia da votação, já então perseguida e hoje totalmente proibida. São dadas algumas instruções pra que o pedido de votos seja feito de modo discreto e coordenado, longe das escolas em que se votam.

Assista até o final, você vai dar muita risada. Até a parte do “lanchinho” lembra nossa piada do pão com mortadela! Mas o pior é a citação descarada da condução, do dinheiro envolvido...

Em 1990, após uma disputa acirrada, Paulo Maluf (então do PDS, que hoje é seu mesmo Progressistas) – que ganhou o 1.º turno – e Fleury, secretário de Segurança do então governador Orestes Quércia (também PMDB), disputaram em novembro o 2.º turno, após muitas trocas de acusações e inúmeros direitos de respostas nas propagandas televisivas. Fleury, poste de Quércia (já que a reeleição pro executivo ainda não existia), saiu vencedor, e seu mandato de 1991 a 1995, apesar dos esforços sociais, acabou sendo marcado pela falência econômica de SP e, em 1992, pelo “massacre do Carandiru”. Quércia (1938-2010), ex-prefeito de Campinas e governador desde 1987, tocou muitas obras importantes, mas sempre esteve afogado em denúncias de corrupção.

Em 1995, o PMDB perdeu o governo de SP pra sua cisão liberalizante, o PSDB, tendo Mário Covas (avô do finado prefeito de SP Bruno Covas e de quem Geraldo Alckmin era vice) como candidato e começando uma hegemonia interrompida somente em 2023, com a posse do bolsonarista envergonhado Tarcísio de Freitas (partido Republicanos). Porém, se contarmos a partir do primeiro governador eleito após 1964, André Franco Montoro, antecessor de Quércia e também do PMDB, e lembrarmos que Covas, Serra e Alckmin também trabalharam com Montoro, podemos considerar que de 1983 a 2023, praticamente o mesmo partido e o mesmo grupo pessoal mandaram em São Paulo. E Freitas, apoiado por Rodrigo Garcia, também PSDB, que lhe passou a faixa, talvez não vá fazer grande diferença...