Esta canção composta pelo ex-coronel do Exército, produtor, letrista, músico e cantor ucraniano Tarás Borovók foi lançada logo após o início da invasão russa à Ucrânia e se tornou um grande sucesso entre os ucranianos e aqueles que estão se engajando diretamente na guerra. Ela se chama “Байрактар” (Bayraktar) e alude a um tipo de drone turco que tem sido fundamental pra destruir posições russas nos territórios ocupados e pra impedir a tomada completa de Kyiv. Apesar da ampla repercussão, só no último dia 28 eu soube de sua existência, ao escutar uma reportagem da BBC britânica. Curiosamente, o ditador turco Recep Tayyip Erdoğan faz jogo duplo, e ao mesmo tempo em que ajuda militarmente a Ucrânia, não aderiu às sanções ocidentais contra a Rússia, com quem mantém antigas relações comerciais e cujos cidadãos usam muito a Turquia como destino turístico ou até de refúgio político.
A primeira versão em vídeo, citada acima, foi lançada em 28 de fevereiro de 2022, apenas quatro dias após o início da invasão, e enquanto isso Borovok carregou outras versões, como este remix (o vídeo mais visto do canal), o áudio oficial e um clipe legendado em inglês, com cenas do Bayraktar atingindo tropas russas. Porém, tanto esse clipe quanto esta montagem feita pela compositora francesa Lisa Schettner, em cujas descrições estão traduções literais em inglês levemente diferentes que me ajudaram muito a traduzir pro português, estão classificados como proibidos pra menores e, portanto, só podem ser vistos por quem está logado no YouTube. Portanto, por praticidade, incorporei pra você ouvir mais rápido apenas a segunda e terceira versões, mas se possível, não deixe de visitar as outras! No quarto link que listei, há também na descrição uma versão poética inglesa feita por uma colaboradora, vale a pena dar uma olhada.
A Istoé Dinheiro também fez uma ótima reportagem sobre a história da canção Bayraktar, e neste canal há uma entrevista com Borovok, mas em ucraniano. Eu mesmo traduzi pro português a partir do ucraniano, mas as duas traduções em inglês me ajudaram demais, sobretudo com pontos que não puderam ser literalmente traduzidos e esclarecimentos dados nos próprios canais. Uma dessas expressões era “tomar sopa com lápti”, sendo lápti o plural de lápot, isto é, uma espécie de alpargata ou espadrilha, também típica de países não eslavos, feita com fibras vegetais de árvores nativas. A expressão original da língua russa menciona o schi, uma sopa típica de beterraba e couve, muito consumida pelos camponeses pobres, e tanto tomar o schi quanto usar lapti aludem a uma condição muito pobre, em que nem colher se teria pra tomar a sopa, tendo que usar essas sapatilhas! (Deixei “sapatos” mesmo porque figura melhor do que aquele calçado.)
Entre outras explicações pra expressões intraduzíveis, “restaurarem um grande país” está no cirílico ucraniano figurando a pronúncia russa dessa expressão, por isso pus as aspas pra indicar que era a fala do Kremlin. “Putleristas” foi minha adaptação pra “rashisty”, ou seja, uma mistura de “rússkie” (russos) com “fashísty” (fascistas), pois o apelido “Putler” (Putin + Hitler) também é muito difundido entre os ucranianos. Na penúltima estrofe, também se menciona o “glukhár”, ave galiforme só existente no hemisfério Norte e chamada em português “tetraz-grande”, mas que na gíria ucraniana também designa um crime cuja investigação provavelmente não terá sucesso.
O título da canção se refere ao drone militar Bayraktar TB2, fabricado pela empresa privada turca Baykar e que a Ucrânia tem usado massivamente e com grande sucesso na defesa contra a Rússia. Em turco, “bayraktar” significa “porta-bandeira” ou “porta-estandarte”, mas a referência é ao sobrenome de Selçuk Bayraktar (n. 1979), um dos engenheiros que desenvolveu a primeira linha de drones nativos turcos, na qual se inclui o citado Bayraktar TB2. Assim, ao lado de Orkut Büyükkökten, temos o segundo turco cujo sobrenome ficou mundialmente famoso devido a um invento pessoal. Curiosamente, Selçuk também é casado com Sümeyye, uma das filhas do ditador Erdoğan, que usou a criação do genro pra matar curdos na Turquia, no Iraque e na Síria, bem como a vendeu pros governos do Azerbaijão e da Etiópia em guerras recentes.
Quanto a Tarás Borovok, ele nasceu na Kyiv soviética em 1973 e começou sua carreira midiática em 2006, após deixar o Exército Ucraniano. A fama global só veio quando começou a trabalhar com canções patrióticas a pedido do Centro de Comunicação do exército após a agressão russa, sendo a proposta inicial com o Bayraktar TB2 apenas um vídeo de propaganda. Mas Borovok decidiu fazer uma canção em estilo folk a respeito, que saiu em duas horas (a letra em 15 ou 20 minutos) e se tornou um hit imediato, pela batidinha envolvente e pelo tom depreciativo com que trata os russos e seu exército. Bayraktar também rodou o mundo em outras línguas, tendo ficado conhecida na França pela colaboração com a citada Lisa Schettner. Casado, Borovok também é pai de Daria (n. 1998) e de Ostap (n. 2016).
Sem mais, seguem os vídeos de Borovok, minha tradução e o original ucraniano. Ótima forma de começar o último mês deste terrível ano de 2022!
Os ocupantes vieram até nós na Ucrânia
Os tanquistas russos se esconderam nas moitas
As ovelhas correram do Leste até nós
Argumentam que suas armas são diferentes
Eles queriam nos capturar imediatamente
A polícia russa está conduzindo inquéritos,
Os doentes do Kremlin fazem uma propaganda
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Російскі танкісти сховались в кущі
Зі сходу припхались до нас барани
Їх доводи - всяке озброєня різне
Вони захопити хотіли нас зразу
Російська поліція справи заводить
Веде пропаганду кремлівський урод
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